/O Óleo na Baía: Da Responsabilidade Fiscal à Ambiental
A Petrobrás cometeu erros que levaram ao acidente de vazamento de óleo na baía de Guanabara. A empresa é a responsável pelo estado do oleoduto, que já sofrera vazamento, embora menor em 1997. Admitindo a inevitabilidade do risco de falha, pois não há instalação industrial com risco zero, não se justifica levar quatro horas para detectar o vazamento, que poderia ter sido minimizado. Ele não foi muito grande, comparado com outros ocorridos no mundo, mas atingiu uma área muito sensível, com mangues, e agravou ainda mais a degradação da baía já extremamente poluída por metais pesados, efluentes químicos e dejetos de outras origens. Não havia monitoração para interromper o fluxo do óleo automaticamente. Os operadores não seguiram a rotina de segurança em face da anomalia observada no bombeamento. Usaram um veículo e depois um helicóptero para ir ver o que estava acontecendo antes de desligar. E uma vez constatado o vazamento não havia meios suficientes para a contenção do óleo, embora a empresa os tenha providenciado com presteza e tenha feito corretamente a mitigação dos efeitos imediatos que atingiram a flora e a fauna. Atendeu os pescadores, buscando resolver seus problemas. No entanto há um oportunismo político e ideológico que busca aproveitar o acidente para generalizar os erros reais, que também ocorrem com empresas multinacionais, como indicativos, falsos, de incompetência do Brasil na área do petróleo.
A COPPE/UFRJ vem há muitos anos realizando estudos científicos e projetos de desenvolvimento de tecnologia de produção de petróleo no mar, tendo dado importantes contribuições à Petrobrás, que domina o cenário internacional nesta tecnologia. Orgulha - se muito disto e, entretanto, fez críticas com independência no caso do acidente porque esta é sua obrigação como instituição universitária. Isto nem sempre é compreendido por pessoas pouco informadas sobre a natureza da Universidade Pública, que sobrevive a duras penas à onda contra tudo que é público, aliando competência a uma independência que inexiste na maioria das instituições privadas. Na Universidade Pública os dirigentes são efetivamente subordinados a colegiados representativo da comunidade e há liberdade de opinião. Disponibilizamos publicamente as imagens sobre o crescimento da mancha de óleo na baía obtidas pelo sistema de rastreamento por satélites de poluição de petróleo no mar, criado em convênio com a Radarsat canadenses. Tivemos de processar as imagens via Canadá. Há cerca de um ano submetemos à ANP um projeto para instalar os equipamentos para obter em tempo real as imagens transmitidas diretamente do satélite, o que permitiria obter muito mais dados.
A necessidade de ampliar os equipamentos, inclusive embarcações apropriadas e sistemas de contenção e retirada do óleo na água, para fazer frente a grandes vazamentos no mar tinha sido debatida, há poucos meses, em um seminário com engenheiros da Petrobrás e profissionais de outras empresas e instituições, de que participei no curso de pós graduação da COPPE para executivos da área de petróleo (MBP). Este é um problema não só do Rio e nem exclusivo da Petrobrás, mas também do Ministério do Meio Ambiente. O planejamento da emergência em casos de acidentes na REDUC já foi inclusive tema de tese de dois doutorandos no Programa de Planejamento Energético, Moacyr Duarte e Alvaro Bezerra de Souza.
Solicitada pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente para cooperar na avaliação dos danos ambientais do vazamento e pela Petrobras para estudar o processo físico de falha do duto, a COPPE vai cooperar também com os Procuradores da República e do Estado na apuração do acidente abrindo todas as informações. Isto foi decidido em reunião com eles e com o CREA, o Sindicato dos Petroleiros, as Secretarias de Meio Ambiente e de Ciência e Tecnologia e a Petrobrás. Informei na reunião, com a presença da Polícia Federal, que recebi denúncia de sabotagem no oleoduto, embora esta hipótese seja improvável apesar de haver grupos interessados em criar dificuldades para a Petrobrás, visando privatizar as refinarias. Na minha avaliação pessoal, seria necessário algo como tracionar o oleoduto sob a água com um cabo puxado por um motor de lancha ou caminhão, o que é difícil naquela área. Não há entretanto por que deixar de considerar todas as hipóteses e de responder a toda denúncia, assumida publicamente pela Associação dos Engenheiros da Petrobras.
Fica a lição de que a Petrobras deve dar maior atenção ao meio ambiente. Foi oportuno o Lula se manifestar em artigo no JB, mas discordo dele em concentrar na Petrobrás o problema. A responsabilidade é também do Governo Federal como acionista majoritário. Não há prioridade para a segurança ambiental, como mostram também os problemas do reator nuclear Angra I. A equipe econômica do governo impede as estatais de fazerem os investimentos necessários, inclusive na área ambiental, restritos pelos compromissos com o FMI. A desvinculação fiscal vai transferir mais recursos federais para o pagamento de juros e operações financeiras duvidosas com grupos internacionais. A responsabilidade fiscal que se discute para governadores e prefeitos deveria ser aplicada aos responsáveis pelo endividamento crescente da União e pelos cortes de recursos federais inclusive para a área ambiental.
Uma vítima é a baía de Guanabara, cuja situação já era ruim e piorou contaminada não só pelo óleo. Apenas os esgotos são alvo do programa da despoluição da baía, nada sendo feito com a poluição industrial.
*Vice-diretor da COPPE/UFRJ