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/Alexandre Szklo e o generoso ofício de ensinar
Compartilhar conhecimento com os mais jovens é, para Alexandre Szklo, professor do Programa de Planejamento Energético da Coppe/UFRJ e um dos agraciados com o Prêmio Coppe Giulio Massarani – Mérito Acadêmico 2010, um exercício de generosidade. Esse é um dos aspectos que mais o seduzem na profissão que escolheu.
Nascido em Brasília há 41 anos, filho de pais cariocas e neto de imigrantes judeus poloneses (por parte de pai) e turcos (por parte de mãe), Szklo veio para o Rio de Janeiro no início dos anos 1970, quando os pais decidiram retornar à cidade do Rio de Janeiro. Ex-aluno do Colégio São Vicente de Paulo, no Cosme Velho, passou a infância em Ipanema, onde mora ainda hoje.
Concluiu a graduação em Engenharia Química em 1993, pela Escola de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Tornou-se mestre em Planejamento Energético pela Coppe/UFRJ em 1996, com a dissertação Percepção, diagnóstico e critérios de tomada de decisão em risco, orientada pelo professor Rafael Schechtman. Em 2001, concluiu o doutorado, também em Planejamento Energético, com a tese Tendências de desenvolvimento da cogeração a gás natural no Brasil, orientada por Maurício Tolmasquim. Trabalhou algum tempo numa indústria química, até começar a dar aulas na Coppe, logo depois de terminar o doutorado.
Na Coppe, Alexandre Szklo encontrou a oportunidade de aliar o prazer do magistério com a pesquisa acadêmica. Até o momento, orientou 29 dissertações de mestrado e dez teses de doutorado, publicou 41 artigos em periódicos científicos indexados e possui 98 trabalhos publicados em anais de congressos no Brasil e no exterior. É autor de nove livros. Até setembro de 2011, foi coordenador do Programa de Planejamento Energético, do qual já havia sido vice-coordenador.
A opção pela engenharia e a paixão pela literatura
Ao optar pela engenharia química, Szklo afastou-se um pouco da tradição iniciada por seus familiares depois que se instalaram no Brasil. “Não havia nenhum engenheiro químico na minha família, tampouco engenheiros com quem eu tivesse contato”, explica. Duas gerações antes, não havia profissionais liberais graduados na família. O avô materno era óptico, e o avô paterno se tornou alfaiate ao vir da Polônia, um pouco antes da Segunda Guerra Mundial. O pai e os tios paternos se tornaram médicos, uma escolha comum entre os filhos de imigrantes judeus. “A minha referência masculina era muito maior na área de medicina do que na de engenharia”, conta Szklo.
Ele nem mesmo considera que tivesse uma vocação especial para a engenharia. Era bom aluno em matemática, mas gostava muito também de história e literatura. Esse gosto tem explicação. A mãe era professora de literatura da UFRJ, e ele e os dois irmãos foram alfabetizados em português e francês. Cresceram entre coleções completas de literatura francesa, num ambiente em que se privilegiava a boa leitura.
Mas, num tempo em que, dos homens que iam para a universidade, esperava-se que escolhessem entre a medicina, a advocacia ou a engenharia, o prazer de resolver problemas matemáticos falou mais alto. “Quando a questão se colocou para mim, pela minha facilidade com matemática, optei por engenharia”, resume.
Já a escolha específica do curso de Engenharia Química e, mais tarde, a descoberta do prazer de ensinar parecem ter sido influenciadas pela lembrança de um antigo professor de química, já falecido, de quem Szklo foi aluno no Colégio São Vicente de Paulo. “O professor Palhares era um sujeito excepcional. Dava aula com um prazer tão grande! Todos os alunos gostavam da aula dele, todos aprendiam. Mesmo os que não gostavam de química. Ele tinha a generosidade dos grandes mestres”, lembra.
O petróleo e a Ilíada
Suas linhas de pesquisa lidam com alguns dos mais candentes temas da atualidade: questões internacionais do petróleo; tecnologia e economia da energia; cogeração; refino de petróleo e mercado de derivados; geopolítica de petróleo e gás natural; captura de carbono; e política e planejamento energético. Szklo é frequentemente chamado para produzir estudos para instituições brasileiras e estrangeiras, como a Agência Internacional de Energia Atômica; o Governo do Reino Unido; o Banco Mundial; o Pew Center on Global Climate Change; a Agência Nacional do Petróleo; a Petrobras; além de grandes empresas privadas.
Com frequência, o gosto de Szklo pela literatura ajuda a temperar a aridez dos temas técnicos com que lida. É o que se vê, por exemplo, num artigo assinado em conjunto com o professor Roberto Schaeffer, também do Programa de Planejamento Energético. No trabalho, os dois fazem uma analogia entre o petróleo e a lança de Peleu, pai de Aquiles, o protagonista da Ilíada, obra de Homero. Para não sangrarem até a morte, todos aqueles que eram feridos pela lança de Peleu deveriam ser feridos novamente pela mesma lança. Só assim alcançariam a cura.
No artigo em questão, justamente intitulado “A lança de Peleu”, Szklo e Schaeffer desenvolvem a ideia de que talvez nenhuma fonte alternativa de energia consiga oferecer todas as virtudes do petróleo. Por isso, a proposta do trabalho é refletir se o próprio petróleo e sua indústria não teriam – dadas sua envergadura, sua capacidade de investimento, sua expertise tecnológica e sua escala – condições de fazer a transição para um mundo sem os problemas geopolíticos e ambientais causados por esse combustível fóssil.
“Em uma refinaria de petróleo há uma multiplicidade de subprodutos e coprodutos, que levam a uma redução de custos e a uma gama de atividades associadas a finalidades energéticas e não energéticas. Talvez nenhuma outra fonte de energia consiga proporcionar tal diversidade”, explica Szklo. Segundo ele, a própria ideia de se trabalhar com uma rota tecnológica dominante pode ser um equívoco. Talvez seja preciso dimensionar e testar várias rotas, ou seja, expandir o problema das fontes alternativas de energia, para o conceito de sistemas alternativos de energia. “É isso que nós estamos analisando. Estamos estudando várias possibilidades. Algumas rotas terão de se integrar e se beneficiar daquilo que chamamos de ‘as virtudes do petróleo’”.
Sempre guiado pelo amor à literatura, há dez anos Szklo decidiu se aventurar na ficção. Escreveu um livro de ficção publicado pela editora 7Letras. Mas, na verdade, ele considera que seu mais belo livro – “um poema gigantesco, que está em permanente mudança” – é Daphne, a filha de 7 anos, nascida de seu primeiro casamento. “Ela é um poema permanente”, define. Sempre que a menina está com ele, procura adiantar as tarefas de trabalho para dar atenção integral a ela. “Quando ela está aqui, eu ajudo com o dever de casa, dou comida e só volto a trabalhar depois que ela dorme. Daphne só traz felicidade”, garante.
Nas horas vagas, Szklo acompanha os jogos do Vasco da Gama, paixão que herdou de toda família paterna (avô, pai e tio). “Sou muito vascaíno”, brinca. Apreciador da boa mesa, confessa que não leva jeito para cozinhar. Prefere aproveitar os pratos preparados pela querida mulher, Ana Carolina.
Até setembro passado, ele costumava nadar e, uma vez por semana, jogava bola com os amigos. Mas as atividades esportivas estão suspensas enquanto se recupera de uma cirurgia no joelho, destinada a corrigir uma lesão provocada justamente pelo futebol. Não sabe se poderá voltar aos gramados.
Perguntado sobre novos projetos para o futuro, diz vagamente que tem “várias perguntas não respondidas”. Mas pelo menos uma resposta sai sem qualquer hesitação: “Meu sonho de futuro é ver a minha filha feliz”.
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Publicado em - 09/11/2011