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/Martin Schmal: o mais químico dos engenheiros

Ao chegar ao laboratório do professor Martin Schmal, três alunos o cercavam em apuros com experimentos e equações. Com voz suave e pausada, contornou a situação, deu as coordenadas necessárias e só então seguimos para a nossa conversa. Com igual paciência, o professor concede entrevista ao Planeta COPPE, relembrando fatos marcantes de sua trajetória profissional e pessoal.

Reconhecido como um dos maiores especialistas em catálise, o professor do Programa de Engenharia Química da COPPE tornou-se o primeiro brasileiro agraciado com o prêmio da Fundação Humboldt, da Alemanha, em 2002, concedido a cientistas que se destacam no cenário internacional. Semanas depois, recebe outra boa notícia: será homenageado com o Prêmio México de Ciência e Cultura, concedido pelo governo mexicano.

Da Alemanha ao Brasil: em busca da liberdade

O início de vida não foi fácil. Filho de judeus alemães, veio com os pais para o Brasil, em 1939, com pouco mais de um ano, fugindo do nazismo que dominava a Alemanha. O pai ficara preso durante três meses num campo de concentração, conseguindo ser solto graças à ação de organizações clandestinas e uma influente consulesa brasileira. Quase um milagre! A vinda para o Brasil foi cercada de tensão. O governo de Getúlio Vargas havia deportado vários judeus para a Alemanha. “Meus pais sofreram muito, perdi 13 pessoas da minha família durante o regime nazista, mas não tenho mágoas do País”, afirma.

A adaptação ao Brasil não foi problema para o pequeno Martin. Na escola, sempre foi bom aluno, principalmente em química. Teve um primário ‘tumultuado’, pulando algumas etapas. “Passei da primeira para a terceira série e desta para a quinta. Até hoje não sei explicar o porquê”, brinca. Pura modéstia!

A opção pela área foi um caminho natural. Cursou engenharia química na Universidade Católica de São Paulo, formando-se em 1964. No ano seguinte, ingressou no mestrado da Coppe, onde conhece o professor Alberto Luiz Coimbra, fundador da instituição, que segundo Schmal contribuiu de forma decisiva para a definição do seu futuro profissional.

Coimbra concebeu um modelo de instituição que priorizava a capacitação de professores, estimulando-os a realizar o doutorado nas melhores instituições e universidades do mundo. Professor e grande conselheiro de Schmal, Coimbra o incentivou a fazer o doutorado na Alemanha. O fundador da Coppe definia Schmal como o mais químico dos engenheiros que ele conhecera até então e o incentivou a fazer o doutorado na Alemanha, onde se destacava a pesquisa e o desenvolvimento tecnológico na área. Ao concluir o mestrado, em 1966, Schmal partiu no mesmo ano para ingressar no doutorado na Technische Universität de Berlim, na Alemanha. Schmal concluiu o curso em apenas quatro anos, embora o período médio para completar o doutorado na rigorosa universidade alemã fosse de cinco a seis anos.

Retorno ao Brasil

Com o doutorado concluído, retorna à COPPE, em 1970, como professor adjunto. Com passagem pela indústria, encontrou na instituição a oportunidade de aliar fundamentação teórica à aplicação prática. “Naquela época os cursos de engenharia química eram muito voltados para a teoria. Procurava um meio de prosseguir fazendo pesquisa, mas de olho na solução de problemas da indústria, de modo a contribuir para o desenvolvimento do país”. Essa é sem dúvida uma das marcas de sua trajetória profissional: desenvolver pesquisas avançadas, sem perder de vista a aplicação industrial.

Professor titular do Programa de Engenharia Química da COPPE desde 1985, Schmal já orientou mais de 65 dissertações de mestrado e 20 teses de doutorado, cerca de 130 publicações em periódicos internacionais, 110 em anais de congressos nacionais e 125 congressos internacionais. Já coordenou dezenas de projetos voltados para a indústria e instituições privadas e governamentais.

Schmal orgulha-se de ter participado da construção da Coppe e do Programa de Engenharia Química nas últimas quatro décadas. “Um dos grandes méritos do Programa é formar pessoal qualificado tanto para a indústria quanto para universidades e centros de pesquisa de todo o País.”

Prêmio inédito

O reconhecimento internacional veio em razão das pesquisas na área de catálise. Coordenador do Núcleo de Catálise (NUCAT) da COPPE, Schmal recebeu em 2002 o Humboldt Research Award, da Fundação Alexander von Humboldt, da Alemanha, em reconhecimento às pesquisas em catálise ambiental realizadas na Coppe, que possui parceria com o Fritz-Haber Institut, do Instituto Max Plank, sediado em Berlim. No final de março de 2002, esteve em Bonn para a cerimônia de premiação. Pela primeira vez um pesquisador brasileiro receberia o prêmio concedido a cientistas de destaque internacional, conhecido no meio científico como um revelador de talentos na área. Para se ter uma idéia, 34 pesquisadores agraciados com esta premiação, criada em 1953, receberam posteriormente o prêmio Nobel.

No começo deste ano, outro êxito. México de Ciência e Cultura como reconhecimento aos trabalhos científicos e tecnológicos realizados nos países da América do Sul e Central e Caribe, além de Espanha e Portugal. Prof. Schmal foi eleito por unanimidade pelo júri para receber o Prêmio, concorrendo com 70 candidatos de 17 países. Para se ter uma idéia da importância desta premiação, entre os acadêmicos brasileiros que já receberam o Prêmio México estão o físico José Leite Lopes (1993), a agrônoma Johanna Döbereiner (1992), o médico Sérgio Henrique Ferreira (1999) e o matemático Jacob Palis (2000).

Pesquisas inovadoras

Há anos os países industrializados buscam catalisadores eficientes para veículos a diesel. Graças às pesquisas desenvolvidas no Nucat, a Coppe ocupa espaço de destaque entre os principais centros de pesquisa do mundo que atuam nesta área. Membro do Comitê Internacional de Catálise, Schmal tem obtido excelentes resultados no desenvolvimento de catalisadores que filtram material particulado (fumaça negra) e gases poluentes provenientes de motores a diesel.Os testes realizados em laboratório vêm obtendo 100% de eficiência na eliminação de NOx e particulados. "Avançamos muito nas pesquisas, já obtivemos excelentes resultados em laboratório, mas o nível de eficiência ainda não é suficiente. Quero fazer mais”, acrescenta Schmal.

Companheira de todas as horas

Casado há 35 anos com Vitória Schmal e pai de duas filhas, Thaíz e Alice, Schmal ressalta ter na família um porto seguro. É com Vitória que divide todos os êxitos de sua vida profissional. Companheira presente desde o início de sua carreira, Vitória foi com ele para Alemanha, no período do doutorado."Enfrentou 13 dias de viagem de navio e adaptou-se ao país sem no início falar uma palavra de alemão. Não tenho só uma esposa, mas uma companheirona”, ressalta orgulhoso o professor, completando que talvez esteja aí a chave do seu sucesso.

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  • Publicado em - 26/06/2003