Comunidade acadêmica debate o PNPG nos últimos dias da consulta pública
Planeta COPPE / Notícias
Data: 25/01/2024
A comunidade acadêmica da UFRJ debateu nesta terça-feira, 23 de janeiro, o Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG), que está nos últimos dias da consulta pública aberta pela Capes. O debate foi promovido pela decania do Centro de Tecnologia (CT) e realizado no auditório da Coppe. Alvo de algumas críticas e muitas sugestões, o novo plano foi consensualmente saudado como uma importante iniciativa, após quatro anos sem um direcionamento estratégico para o setor.
A coordenadora de Pós-Graduação do CT, professora Juliana Loureiro, foi a mediadora do debate e apresentou o plano para o público presente ao auditório e aos que assistiram pelo YouTube. Segundo a professora do Programa de Engenharia Mecânica (PEM), da Coppe, o novo PNPG elenca desafios como elementos motivadores da construção do mesmo, começando pela elevação do percentual de mestres e doutores, e passando pela redução de assimetrias de oferta nacionais; ampliação das interações com o mercado de trabalho; expansão do sistema com manutenção da qualidade.
“O documento está estruturado em sete eixos e traz diretrizes importantes como ampliar possibilidade de acesso em regiões menos favorecidas; ampliar políticas de assistência e acolhimento; reconhecer pós-graduandos como pesquisadores em início de carreira; ampliar composição racial, étnica e linguística. O plano fala explicitamente em promover a Extensão na pós-graduação e a interação da universidade com ambientes diversos. A Extensão já vinha sendo formalizada nas diretrizes nacionais curriculares da graduação, aparece como diretriz a ser seguida na pós-graduação”.
“O Sistema Nacional de Pós-Graduação (SNPG) seria orientado à formação de recursos humanos de alto nível, de forma equitativa e com foco na prospecção e solução dos problemas da sociedade”, explica professora Juliana, que, ao final do evento informou que a Decania solicitaria uma prorrogação do prazo de consulta pública.
Outros objetivos seriam a ampliação da presença internacional para tornar o país um centro de atração da comunidade acadêmica internacional e retomar protagonismo do Brasil na cooperação do Sul global e promover multilinguismo.
Natalia Trindade, secretária-geral da Associação de Pós-Graduandos (APG) e aluna da Faculdade de Direito da UFRJ, destacou que os direitos dos pós-graduandos são estratégicos para a construção do PNPG e como tal devem constar como meta, não apenas no PNPG, como no Plano Nacional da Educação (PNE), mas refletiu sobre a falta de atenção que o Plano e a consulta pública têm recebido.
“Somos menos de 1% da população brasileira, em que pouco mais da metade conclui o ensino médio. A discrepância social é fundamental para entender o desinteresse da opinião pública sobre o tema”.
O professor Márcio Nele, do Programa de Engenharia Química (PEQ), concordou com a representante discente. “O que move a pós-graduação são os alunos e eles devem ser a prioridade. O valor da bolsa deveria ser um tema central, ele poderia ser indexado ao salário do professor-adjunto”.
Críticas construtivas
O professor José Carlos Pinto, também do PEQ saudou a iniciativa da Capes em propor um novo plano de pós-graduação, mas teceu críticas ao mesmo. “Pode parecer contraditório. O documento é bom, mas o plano é muito ruim. Há muitas palavras vagas, mas não há metas, prazos, cronograma. É impossível fazer uma avaliação. Não é um plano, é um brainstorm. Caso seja um brainstorm e o plano ainda venha adiante, isso aumenta a importância da consulta pública e é surpreendente que a academia não esteja discutindo à exaustão este plano. Até para que possamos influenciar de maneira organizada a fabricação deste plano”.
“Há uma sub-representação de negros na academia, sobretudo de mulheres negras, e o documento praticamente não toca esse tema. Acho que deveríamos ter uma meta de dobrar ou triplicar a participação de negros na pós-graduação. Além disso, há os prejuízos que o produtivismo está trazendo à universidade no mundo e no Brasil, em particular. Acho que avaliar qualidade com base em índices de quantidade tem que ser repensado. Tem circulado entre os colegas um texto da Isabelle Stengers (filósofa belga) sobre isso”.
O professor Guilherme Horta Travassos, do Programa de Engenharia de Sistemas e Computação (PESC) disse enxergar no documento preliminar “um conjunto de perspectivas ainda que positivas, mas não consigo, como engenheiro, enxergar um plano”.
“Estamos tentando resolver um problema de pós-graduação tendo um problema infinito de educação básica. Nosso problema não é aumentar o número de indivíduos que buscam a pós-graduação e sim aumentar o número de indivíduos que tenham condição de segui-la. Além disso, não aparece o termo ‘financiar’, o que pra mim é ter dinheiro para comprar computador e reagente. Senti falta dos termos ‘valorizar’ e ‘remunerar’. O texto não fala de remuneração adequada. Também sinto falta de uma perspectiva de fomento à Ciência na educação básica”.
Na avaliação do professor Alexandre Pino, os planos nacionais de pós-graduação devem ser de longa duração e serem retroalimentados. “São sete eixos gigantes, com grandes planos, para mudar em apenas quatro anos? Provavelmente não conseguiremos essas mudanças nesse prazo. Acho que a Capes deveria ter um planejamento de curto prazo e outro de longo prazo”.
“A Capes deveria mudar completamente a pós-graduação no Brasil. Pensar diferente, fora da casinha, fora dessa coisa de todo dia que já fazemos. Todo mundo batendo meta, vamos pensar em métricas diferentes. Tá na hora da pós-graduação mudar. Não dá pra ser abrupta e radical, mas tem que ser uma mudança de longo prazo. O que é melhor pra mim talvez não seja o melhor para o país. Pega o pessoal da Educação e em vez de premiar por produção, premia por alavancar o ensino básico”, propôs o professor do Programa de Engenharia Biomédica.
Contraponto: um importante diagnóstico estratégico
O superintendente acadêmico de Pesquisa (PR-2), professor Felipe Siqueira Rosa, preferiu enfatizar as qualidades do Plano e o trabalho feito pela Capes, que incluiu oficinas das quais participaram representantes dos 27 estados. “A despeito das críticas, que são meritórias, acho que é um bom plano, tendo em vista a conjuntura que herdamos. Fomos de nenhum plano, desde 2020, para um feito com um diagnóstico muito bom. Temos um sistema de pós-graduação muito amplo, parrudo, com 100 mil ingressantes por ano, e desafios complexos na permanência, interiorização, redução de assimetrias intra e interestaduais. Para termos diretrizes que dessem conta de todos esses desafios, eu creio que a Capes, em conjunto com pesquisadores do Brasil inteiro, fez o que é possível”, defendeu Felipe Rosa.
“Creio que esta consulta é um bom ensaio para que no próximo plano seja feita consulta pública mais cedo, desde as oficinas. Mas, sinceramente, se dessa vez fosse tentado um processo mais aberto, mais democrático, infelizmente tomaria mais tempo para que as informações fossem coletadas, decantadas, e transformadas em um plano, com um consenso”, avaliou o professor do Instituto de Física.
“Acho que o plano não deveria ser encarado de forma anatídica. Anatídeos é a família dos patos, que sabem andar, nadar e voar e não fazem bem nenhuma das três coisas. Acho que as instituições e programas não devem encarar o plano de maneira uniforme. Cada programa vai encontrar nas diretrizes pontos em que podem atuar de forma mais efetiva. Se na Engenharia, a integração com os ensinos fundamental e médio for mais difícil, outros programas vão achar mais fácil. A integração com a indústria e a inovação são mais naturais com a Engenharia, enquanto outros programas podem achar mais difícil. Acho que na UFRJ temos muitas vezes essa tendência anatídica. Cada programa tem que encontrar sua vocação nesses eixos e persegui-la”, explicou.
A professora Fernanda Mello, superintendente acadêmica de Pós-graduação (PR-2/UFRJ), observou que o período escolhido para a consulta “não foi muito feliz pois pegou um período de festas de final de ano e que muitas pessoas tiram férias” e ponderou que o plano disponível não é um documento final, mas ainda em construção e que traz um “importante diagnóstico estratégico”. “Quem não leu o documento em sua íntegra, recomendo que o faça. É bastante útil para que façamos reflexões”, recomendou.
“Como todo documento amplo, ele peca por não trazer os mecanismos para atingir metas, ele não traz métricas, traz diretrizes. Vem após um período de ausência de planejamento estratégico, acaba sendo um documento bastante amplo, mas ele traz os pontos-chaves”, ponderou a professora do Instituto de Doenças do Tórax (IDT/UFRJ).
Para o professor Felipe Rosa, dadas as condições orçamentárias tanto das universidades como da própria Capes, “não adianta criarmos expectativas não realistas e esperar que sejam concretizadas. Claro que queremos remunerações melhores para alunos e professores, mas dadas as restrições orçamentárias de curto prazo acho isso muito difícil”.
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