Saul Fuks: um idealista que apostou na academia

Planeta COPPE / Engenharia de Produção / Notícias

Data: 10/12/2012

Nascido no Centro do Rio de Janeiro em 26 de junho de 1928, Saul Fuks é filho de Berek Wolf Fuks e de Malka Fuks, que deixaram a Polônia em 1927 para tentar vida nova no Brasil. Berek decidiu deixar a Polônia em função da crise econômica pela qual passava o seu país. Mas a decisão resultou em um bem maior e garantiu a sobrevivência de parte da família Fuks, que, anos mais tarde, perdeu praticamente todos os familiares em campos de concentração, vítimas da perseguição aos judeus na Europa.

Berek montou um pequeno estabelecimento comercial no Centro do Rio e teve dois filhos no Brasil: Saul e Leão. Ambos estudaram em escola pública, motivo de orgulho para Saul, que faz questão de ressaltar a importância do ensino público na sua formação. Cursou o primário no Colégio Estadual Francisco Cabrita, na Tijuca, o ginásio e o científico no Colégio Pedro II, onde ingressou aos 10 anos. Sempre se destacou nos estudos, até a universidade, mantendo-se entre os primeiros da classe.

O interesse pela leitura começou cedo. Aos 10 anos de idade, já lia clássicos da literatura como Os dez dias que abalaram o mundo, de John Reed, e Crime e castigo, de Dostoievski. O estímulo pela leitura foi cultivado pelo pai, um artesão que falava três línguas, gostava de literatura e costumava debater o tema das obras com os filhos durante o jantar. A satisfação de participar dos debates mantinha Saul em dia com a leitura.

Mas a aptidão para a matemática seria decisiva na escolha de sua carreira. Ao ingressar em 1945, aos 17 anos, na Universidade do Brasil, atual Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), optou pelas ciências exatas. Deixou a universidade em 1950 com dois diplomas de graduação (Engenharia Civil e Engenharia Elétrica).

Logo que deixou a faculdade, montou com três sócios uma firma construtora. De 1950 a 1967, a empresa foi responsável por várias edificações, incluindo dois projetos assinados por Oscar Niemeyer para prédios residenciais, um na Rua Haddock Lobo, em Copacabana e outro na Avenida Pasteur, em Botafogo.

Mas o exercício da atividade empresarial nunca o afastou da academia. Saul matinha sua curiosidade intelectual saciada. Nos anos 1960, fez um curso de extensão em Tecnologia das Construções, no Instituto Nacional de Tecnologia (INT); graduou-se, em 1964, em Engenharia Econômica, na Universidade do Brasil; e fez uma pós-graduação lato sensu em Economia, concluída em 1968, no Conselho Nacional de Economia (Cendec). Seu desempenho acadêmico chamou a atenção de um dos professores do Conselho, o futuro ministro do Planejamento, João Paulo dos Reis Veloso, que o convidou para ingressar no Instituto de Pesquisas Econômica e Aplicada (Ipea) como pesquisador, no setor de Planejamento Regional e Urbano. Assumiu o cargo, em tempo parcial, passando a exercer as duas atividades, empresário e pesquisador.

Da ressaca ideológica a uma nova utopia

Desde cedo afinado com os ideais de esquerda, Saul Fuks foi influenciado pelo pai, membro do Bund, partido socialista judaico polonês, e mais tarde pelo colega Salomão Malina, último secretário geral do Partido Comunista Brasileiro (PCB) e dirigente comunista e herói da Força Expedicionária Brasileira (FEB), a quem conheceu na Escola de Engenharia da UFRJ. Em 1945, Saul ingressou no PCB, assumindo, com determinação, a militância do partido.

Foi membro do conselho diretor do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (Iseb), cujo corpo docente era formado por pensadores como Ignácio Rangel, Paulo de Castro, Hélio Jaguaribe, Guerreiro Ramos, Nelson Werneck Sodré, entre outros. No período da ditadura, o instituto foi fechado pelos militares.

Mas não foi poupado da crise que atingiu o movimento comunista mundial desde a publicação, em 1956, do “Informe Secreto”, de Nikita Kruschev, que denunciou as atrocidades ocorridas no período do governo de Stalin, na União Soviética. Saul relata, com tristeza, a decepção sofrida por militantes do movimento em todo o mundo e que resultou no afastamento de lideranças e em uma “debandada geral” de membros do partido. “Sofremos naquele momento uma grande desilusão em relação à aplicação da utopia socialista”, lamenta.

Na época, Saul trabalhava com Agildo Barata, membro do comitê central do PCB que foi integrante da Intentona Comunista contra o governo Vargas, liderada em 1935 por Luís Carlos Prestes. O professor confessa que, nesse período, viveu uma espécie de vazio existencial. Recorda das conversas que tinha com Agildo Barata, durante longas caminhadas na orla de Copacabana, onde refletiam sobre os erros na aplicação da ideologia que levaram ao descrédito em relação aos ideais socialistas.

“Só me recuperei daquele vazio existencial quando ingressei na COPPE. A idéia de criar um centro de pesquisa formado por um grupo de pessoas dispostas a mudar a realidade do país, por meio da educação, foi o meu remédio”, ressalta o professor. Atraído pelo caráter inovador da pós-graduação, a primeira do Brasil em engenharia, inscreveu-se em 1968 no curso de mestrado em Engenharia de Produção. Não fugiu à regra. Pelo seu ótimo desempenho no curso, concluído em 1970, foi convidado para ser professor da COPPE.

“Coimbra nos contagiou com a sua concepção de universidade: moderna, arrojada e compromissada. O grupo era pequeno. As pessoas que dele participavam trabalhavam em condições materiais precárias, mas mantinham-se determinadas a transformar a universidade, tornando-a mais comprometida com o desenvolvimento do País e com a sociedade brasileira”, relata.

Saul queria muito participar daquela experiência. Como a dedicação exclusiva e o tempo integral eram requisitos inegociáveis para se tornar professor da COPPE, tomou a decisão de desligar-se da empresa e do Ipea e aceitou o convite. “Nos primeiros anos, ninguém tirava férias: chegávamos todos os dias às 8 horas e saíamos depois das 17 horas. O esforço para construir a instituição foi grande, mas valeu a pena”, conclui.

Música na academia

Professor titular da COPPE/UFRJ, Saul Fuks passou a se dedicar à vida acadêmica desde que ingressou na Instituição, em 1970. Mestre em Engenharia de Produção pela COPPE/UFRJ (1970) e doutor em Pesquisa Operacional pela Universidade de Berkeley (1980), o professor orientou oito dissertações de mestrado e 18 teses de doutorado, publicou 40 artigos em periódicos nacionais e estrangeiros, e apresentou 25 trabalhos em congressos, nacionais e internacionais. Possui artigos publicados em oito livros.

Na universidade, ajudou a criar e coordenou o primeiro curso de mestrado e doutorado em planejamento urbano do Brasil, o Planejamento Urbano e Regional (PUR), que, anos depois, foi transferido para a Faculdade de Arquitetura da UFRJ, passando a se chamar Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (Ippur). Também foi um dos fundadores do Programa Interdisciplinar em Filosofia da Ciência, que nasceu na COPPE e oferece cursos de mestrado e doutorado em História das Ciências, das Técnicas e Epistemologia, ministrados por professores de várias unidades da UFRJ.

Saul criou o programa Quintas Musicais, que, durante 16 anos, levou ao Centro de Tecnologia da UFRJ grandes intérpretes da música clássica e popular brasileira como Nelson Freire, Arthur Moreira Lima, Lílian Barreto, Linda Bustani, Paulinho da Viola, Luiz Gonzaga, Turíbio dos Santos, entre outros.

Saul é pai de Hélio, Mário e Maurício filhos de Sima Fuks, com quem foi casado 35 anos, e de Rebeca, filha de sua união com Valéria da Mota Leite. Profundo conhecedor de música clássica, sua iniciação começou de maneira peculiar. Seu barbeiro era da claque do Theatro Municipal e, um dia, o convidou para assistir a um concerto. Gostou tanto que passou a fazer parte da claque. Dessa forma, freqüentou o Municipal por mais de 20 anos, assistindo gratuitamente à maioria dos espetáculos. “Sou viciado no Municipal”, confessa.