Crônica de uma crise anunciada: desmatamento pode causar grandes prejuízos econômicos ao Brasil
Planeta COPPE / Planejamento Enérgico / Notícias
Data: 25/09/2020
O desmatamento na Amazônia, que em agosto deste ano atingiu uma área de 1.499 km², próxima ao tamanho da cidade de São Paulo, segundo dados do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), poderá causar enormes prejuízos econômicos ao Brasil. Em artigo publicado na revista Nature Climate Change, em 2018, professores e pesquisadores da Coppe/UFRJ já sinalizavam que o cenário de fraca governança poderia levar o Brasil a prejuízo financeiro significativo, estimado em cinco trilhões de dólares nas próximas três décadas. Entre os fatores desencadeadores, destacaram o descontrole do desmatamento e o incentivo à agropecuária predatória.
No estudo, os pesquisadores definiram três cenários de governança ambiental: fraco, intermediário e forte, e estimaram o custo para a economia brasileira nesses três cenários de governança, tendo em vista que o Brasil ainda teria que cumprir compromissos climáticos. O estudo foi realizado pelos professores do Programa de Planejamento Energético da Coppe Roberto Schaeffer, André Lucena, Alexandre Sklo e Pedro Rochedo, e pelos pesquisadores da Coppe Alexandre Koberle (hoje no Imperial College, em Londres) e Regis Rathman, junto com colegas da UFMG e UNB.
“Comparando os valores, estamos acelerando em direção ao cenário de governança fraca”. “Esse é custo em um cenário em que o Brasil ainda mantém seu compromisso climático. Ou seja, não está incluído o custo dos impactos econômicos das mudanças climáticas em si (eventos extremos, ondas de calor, perdas de produtividade, doenças, etc)”, antecipou o professor Pedro Rochedo.
O cálculo adotado pelos pesquisadores levou em conta o que chamam de “orçamento de carbono”. Segundo este orçamento, o Brasil teria direito a emitir cerca de 24 Gt (24 bilhões de toneladas) de CO2 de 2010 a 2050. “A gente chegou a este custo de cinco trilhões de dólares tendo por base o preço de carbono médio da literatura (atualmente, cada tonelada de CO2 é precificada entre 10 e 20 dólares, e a projeção é que o preço da tonelada chegue a 370 dólares em 2050). Uma espécie de multa ou compra de certificados para compensar o excesso de emissões. Quando se excede esse orçamento de carbono, o país paga para que outra nação faça o que ele não fez. Seja através de uma troca de certificados ou através de outro mecanismo. É o mercado de carbono”, explica o pesquisador.
Retrocesso também nas relações internacionais
Em junho de 2020, um grupo de investidores internacionais enviou uma carta aberta a embaixadas brasileiras em oito países (Estados Unidos, Japão, Noruega, Suécia, Dinamarca, Reino Unido, França e Holanda) manifestando preocupação com o aumento do desmatamento no Brasil. Entre os signatários, que em conjunto administram US$ 3,75 trilhões em ativos, estão investidores que integram a Iniciativa de Investidores por Florestas Sustentáveis e a rede Princípios para o Investimento Responsável.
“É com grande preocupação que observamos a tendência de crescimento do desmatamento no Brasil. (…) Estamos preocupados com o impacto financeiro que o desmatamento e a violação dos direitos de povos indígenas podem ter sobre nossos clientes e companhias investidas, por potencialmente elevarem os riscos de reputação, operacional e regulatório”, escreveram os gestores.
De acordo com o Imazon, este foi o pior mês de agosto em 10 anos de monitoramento da Amazônia, com os alertas de desmatamento superando em 68% os registros para o mesmo período no ano passado.
No Centro-Oeste do país, a situação também é grave. O número de focos de incêndio registrado neste Pantanal entre janeiro e agosto deste ano equivale a tudo o que queimou no bioma nos seis anos anteriores, de 2014 a 2019, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Os dados revelam que, entre janeiro e agosto, foram registrados pelos satélites do Inpe um total de 10.153 focos de incêndio no Pantanal. O número deste ano é três vezes superior aos 3.165 focos de incêndio verificados entre janeiro e agosto de 2019. Em relação aos 603 focos confirmados em 2018, o cenário deste ano representa uma alta de 1.700%.
Segundo a vice-diretora da Coppe/UFRJ, professora Suzana Kahn, a política ambiental atual é um retrocesso, não apenas por si só, como para as relações internacionais e o desenvolvimento econômico do país. “Ainda que não se goste de floresta, não se ligue para índios ou se ache que aquecimento global é coisa de comunista, o que se está atacando é nossa chance de estarmos inseridos em uma economia global”, criticou.
“Além da questão climática, há a biodiversidade que é um ativo econômico enorme. É a riqueza de uma economia moderna, é como se no passado virássemos as costas para os campos de petróleo. Para que essa riqueza esteja disponível, a floresta precisa estar de pé”, concluiu a professora, que preside o Comitê Científico do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas.
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