Brasil terá que gastar mais de três trilhões de dólares se não eliminar o desmatamento ilegal até 2028
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Data: 24/03/2023
O Brasil terá que gastar mais de US$ 3 trilhões em custos de compensação ambiental até 2050, caso não elimine o desmatamento ilegal nos próximos cinco anos. Esta é uma das conclusões do Programa de Transição Energética, um estudo elaborado por pesquisadores da Coppe/UFRJ, em parceria com a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), o Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri) e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
Participaram do estudo os professores do Programa de Planejamento Energético (PPE), Alexandre Szklo e Roberto Schaeffer, e os pesquisadores Mariana Império (pós-doc) e Matheus Poggio (doutorando), ambos do Centro de Economia Energética e Ambiental (Cenergia), laboratório vinculado ao PPE.
De acordo com o relatório disponível no site do Cebri, eliminar o desmatamento ilegal (até 2028) significa evitar o lançamento na atmosfera de 21 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa até 2050. Caso isso não aconteça, torna-se tecnicamente inviável que as emissões de GEE sejam zeradas em 2050, fazendo com que o país tenha de compensar suas emissões, se transformando em comprador (e não um vendedor) de créditos de carbono. Neste caso, o Brasil terá de arcar com um custo de compensação de até US$ 3,4 trilhões para atingir os compromissos assumidos por sua Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, na sigla em inglês), considerando as perspectivas mais elevadas de preços de carbono no longo prazo.
O trabalho apresenta três cenários distintos de transição energética para o país até 2050: “Transição Brasil”, “Transição Alternativa” e “Transição Global”. Os cenários são usados para explorar diferentes opções de mitigação de emissões, apresentando trajetórias de emissão convergentes com o objetivo de neutralidade climática no Brasil até meados do século.
Os cenários “Transição Brasil” (TB) e “Transição Alternativa” (TA) são construídos com base nos compromissos assumidos pelo país em sua Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC), buscando indicar trajetórias custo-eficientes a partir de diferentes perspectivas sobre como evoluem as políticas públicas, os consensos sociais, os comportamentos de empresas e consumidores. Eles também consideram o desenvolvimento e a difusão de novas tecnologias. Nestes cenários, seriam evitadas, aproximadamente, 30 bilhões de toneladas equivalentes de CO2 até 2050.
Já no cenário “Transição Global” (TG), a trajetória de descarbonização é moldada a partir da contribuição do Brasil em um mundo alinhado para limitar o aumento médio da temperatura global em até 1,5°C. Para o cenário TG, o esforço de mitigação de emissões é ainda maior, evitando cerca de 40 bilhões de toneladas equivalentes de CO2 no período.
De acordo com o relatório, o Brasil deve aproveitar vantagens competitivas existentes no país para construir e financiar vantagens competitivas do amanhã, requalificando ativos e migrando expertises no sentido da transição energética de indústrias de O&G, biocombustíveis, renováveis e nuclear. Os autores recomendaram a combinação e a competição entre soluções tecnológicas diversas (neutralidade tecnológica), com a adoção de mercados abertos, diversos e competitivos.
Segundo Mariana Império, as mensagens principais veiculadas pelo relatório aparecem nos três cenários, como a redução urgente do desmatamento, a atualização dos marcos regulatórios e o desenvolvimento ou ganho de escala de novas tecnologias e infraestruturas. “Nosso modelo aborda muitas tecnologias e cada uma tem um grau de maturidade diferente, estariam disponíveis em horizontes temporais diferentes, se houver os estímulos adequados. Eólica e solar já estão aí e podem ser ampliadas, mas falamos de tecnologias mais disruptivas também, como a captura e estocagem de carbono, que já existem, mas ainda são incipientes e mais caras”, explica a pesquisadora do Cenergia.
“Até 2030, há pouco tempo para desenvolvimento e aplicação de novas tecnologias no campo da energia. Por isso, o uso do solo é muito importante para as metas de curto prazo. Além de encerrar o desmatamento, o quanto antes, é preciso reflorestar também. Há várias dinâmicas de uso de solo que ajudariam no curto prazo. Isso não quer dizer que elas sejam fáceis, não quer dizer que vão acontecer, mas são possibilidades”, acrescenta Mariana.
Demanda de energia crescerá 49,25%
Na avaliação de Mariana, um diferencial do projeto feito com o Cebri e a EPE é a sua visão conjunta. “Cada etapa do projeto foi conversada com empresas do setor energético, do setor elétrico, e eles contribuíram com inputs específicos para a construção dos cenários. Trabalhamos com dois modelos de avaliação integrada (IAMs) criados aqui no laboratório: o Coffee (Computable Framework For Energy and the Environment) e Blues (Brazil Land Use and Energy Systems). Nós utilizamos um orçamento de carbono global, vindo de modelos que trabalham com interação climática, e aplicamos num modelo global como o Coffee. A partir disso, obtemos a porcentagem do Brasil no orçamento de carbono global e rodamos no nosso IAM local, o Blues. Como temos modelos de escalas diferentes, conseguimos ser mais detalhistas, tanto para energia, quanto para uso do solo”, detalha a pesquisadora.
Um dos maiores desafios é o crescimento da demanda de energia primária que passará, segundo o estudo, de 268 Mtep (milhões de toneladas de petróleo equivalente) em 2020 para cerca de 400 Mtep em 2050 em todos os cenários.
“Quando falamos em reduzir emissões, pensamos que haverá o crescimento da demanda por energia devido ao crescimento populacional, maior uso de equipamentos, o desejável crescimento econômico, redução de desigualdades sociais e o crescimento da atividade industrial. É o desafio da transição energética, manter o crescimento econômico, associado ao menor consumo energético e à redução de emissões”, esclarece a pesquisadora da Coppe.
“Na parte de energia, o que é proposto para NDC até 2030, nós já temos, como percentuais de renováveis na matriz elétrica e energética. Até 2030, este é um jogo ganho. Mas, de 2030 para 2050, a NDC não indica nenhum instrumento político que aponte o caminho para a neutralidade climática. Então, o estudo é importante também por indicar opções. Há a possibilidade de usar combustíveis alternativos, como diesel verde, resultante da gaseificação da biomassa, de florestas energéticas, como eucaliptos e pinus. Ele substitui o diesel de maneira mais eficiente do que o biodiesel, é um combustível drop in. Ou seja, pode aproveitar a frota de ônibus e caminhões, sem precisar adaptar o motor ou cadeia de abastecimento. Esses combustíveis drop in, como diesel, querosene e biobunker podem ajudar a descarbonizar os setores de difícil descarbonização, como marítimo e aéreo também.”, conclui Mariana Império.
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