Coppe premia o mérito acadêmico e relembra Massarani e Lobo Carneiro
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Data: 19/12/2022
A Coppe/UFRJ promoveu na última terça-feira, 13 de dezembro a cerimônia de entrega do Prêmio Coppe Mérito Acadêmico. Os professores Luís Marcelo Tavares e Leonardo Sales Araujo, ambos do Programa de Engenharia Metalúrgica e de Materiais (PEMM), foram agraciados com o Prêmio Giulio Massarani nas categorias docente sênior e docente jovem, respectivamente, por terem se destacado pela produção acadêmica, formação de Recursos Humanos e trajetória profissional. O professor Edson Watanabe, do Programa de Engenharia Elétrica (PEE), foi contemplado com o Prêmio Lobo Carneiro pelos mesmos critérios e também por sua destacada contribuição à instituição.
De acordo com a diretora acadêmica da Coppe, professora Lavínia Borges, a Coppe é uma instituição que preza pela qualidade e excelência em padrões internacionais, buscando sempre o equilíbrio entre ciência básica e pesquisa aplicada.
“Avaliamos anualmente todos os nossos professores e buscamos atualizar os padrões de avaliação. Essa avaliação existe desde que a Coppe foi criada há 59 anos. O prêmio Giulio Massarani foi criado em 1998, para a partir dessa avaliação acadêmica e a partir da importância dessa produção para a sociedade e para a Engenharia, a nossa comissão de avaliação docente elenca os professores que mais contribuíram no biênio. Em 2008, foi criado o prêmio junior oferecido aos professores que têm menos de 15 anos de graduação. No mesmo ano foi criado o Prêmio Lobo Carneiro, que além das questões acadêmicas, também avalia a contribuição para a instituição ao longo da carreira”, explicou.
Segundo o professor Glauco Taranto, presidente da Comissão de Avaliação de Docentes (CAD) da Coppe, “a comissão usa critérios quantitativos e qualitativos para categorizar nossos docentes. A força da academia é baseada numa avaliação justa e coerente dos seus docentes. É o que a CAD procura fazer”.
O vencedor do prêmio Lobo Carneiro, professor Watanabe, teve como padrinho o professor do Programa de Engenharia Civil da Coppe e Professor Emérito da UFRJ, Luiz Bevilacqua, que o conheceu ainda estudante, nos anos 1970, e o descreveu como um “excelente estudante, que começou, rapidamente, uma carreira acadêmica que se adivinhava muito profícua, como realmente tem sido. Nós, professores universitários, somos exploradores, escavadores, transformadores e comunicadores e Watanabe fez essas quatro tarefas com excelência. Aprofundou temas, junto com colegas e alunas, conseguindo projeção internacional de grande valor”.
Professor Bevilacqua contou ter conhecido a família Watanabe e que viu como a vocação cientifica passou de pai para filho. “O pai dele era também um pesquisador. Agricultor, produtor de tomates, e discorria sobre sua produção, não apenas com entusiasmo, mas com conhecimento e criatividade. Vejo Watanabe como continuidade de seu pai, de sua família, e a eles estendo a minha homenagem. Nenhuma pessoa é só, nenhuma pessoa é uma ilha. Tenho imenso prazer em dizer que ele contribuiu muito também em minha vida”, reconheceu.
Professor Watanabe admitiu que a sua iniciação científica começou ainda na infância, quando morava em um sítio em Miguel Pereira, no sul fluminense. “Com 9 anos, voltando da escola, meu pai perguntou se eu conhecia o padre Mendel (Gregor Mendel, considerado o pai da genética). Achei que fosse de alguma igreja da região. Ele me explicou que esse padre tinha feito experiências cruzando sementes de ervilha e conseguiu criar uma variedade diferente. Meu pai queria fazer o mesmo, mas com tomates para ter uma variedade que fosse mais resistente a pragas. Ele só tinha o primeiro ano primário em português, mas tinha estudado japonês com minha avó e lia sem grandes formalidades”.
“Quando estava no terceiro ano, um professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro foi visitar o sítio onde eu morava em Miguel Pereira e meu pai perguntou onde eu deveria estudar. Ele respondeu que eu deveria ir para o Colégio Pedro II. Com 11 anos vim pro Rio de Janeiro. Era um excelente colégio. Em parte, eu fiquei em internato e, em parte do tempo, em casa de famílias, pois eu não tinha parentes aqui. Eu não teria chegado até aqui sem essas famílias e, principalmente, sem a escola pública”.
Ao relembrar sua trajetória acadêmica, Watanabe destacou a escolha pela Eletrônica de Potência como linha de pesquisa. “Na época não era tão importante, mas agora é, pois trata de conversão de energia elétrica e a previsão é que antes de 2030, 100% da energia elétrica gerada vai ter sido processada por algum conversor eletrônico de potência. Além disso, a chamada indústria 3.0 incorporou automação nas linhas de montagem e a eletrônica de potencia permite o controle dos robôs”.
“Por fim, se acham que eu mereci o prêmio Lobo Carneiro por minha dedicação à instituição, recomendo que leiam a biografia do Pinguelli. Ele ia muito além de pensar a instituição, pensava o Brasil, Bevilacqua tem muito disso também. Ele pensava no mundo, pensava na Humanidade. Criou o Instituto Virtual de Mudanças Climáticas quando quase não se pensava nisso. Gostaria que muitos dos nossos jovens professores começassem a pensar mais no Brasil e no mundo e um pouco menos nos números de fator de impacto, embora eles também sejam importantes”, concluiu o ex-diretor da Coppe.
“Não há sustentabilidade sem a indústria mineral”
Coube ao professor Rodrigo Magalhães de Carvalho apresentar o seu colega de PEMM e vencedor do Prêmio Giulio Massarani, categoria sênior, Luís Marcelo Tavares, a quem descreveu como tendo um perfil de liderança, “com capacidade de formar grupos, nuclear conhecimento, estar disposto a aceitar desafios e pensar o futuro da área”.
“Na Coppe, Luís Marcelo Tavares começou suas linhas de pesquisa em fratura de partículas e modelagem matemática da cominuição. Em 2005, publicou o livro Beneficiamento Gravimétrico, que é referência no Brasil sobre o assunto, onde a literatura sobre o tema é escassa. Também causou uma mudança de paradigma em métodos de elementos discretos, com o Tavares breakage model. Em 2022, apareceu como o 27º pesquisador mais influente na área de mineração e engenharia metalúrgica no mundo, e o 11º considerando apenas publicações em 2021, o primeiro na América Latina”, elogiou.
Professor Luís Marcelo Tavares admitiu que ao ser convidado a realizar concurso para a Coppe, não conhecia a instituição. “Porque eu sou engenheiro de minas e não tem essa graduação aqui na UFRJ. Então, o professor Farias mandou por correio um dossiê explicando o que era a instituição e eu me impressionei”.
“Ao chegar, tive a oportunidade de ver o que é o espírito Coppe, sendo acolhido pelo professor Farias e o pessoal do Laboratório de Química de Interfaces, depois os colegas de almoço no Burguesão. Depois, fui convidado pelo professor João Marcos a assumir a coordenação acadêmica do PEMM e foi um aprendizado fantástico entender como a instituição funciona. Também conheci pessoas folclóricas e interessantíssimas, como Paulo Frutuoso, que durante dois anos usou seu repertório de piadas de gaúcho às minhas custas, Amaranto Pereira, Renato Cotta, Nelson Violante, Ricardo Musafir”, relembrou.
De acordo com o professor, a sua principal motivação em vir para a Coppe foi iniciar um núcleo de pesquisa. “Eu tinha conhecimento teórico, mas não tinha experiência prática, e tive um grande aprendizado com pequenas e médias empresas, minhas sugestões começaram a ser implementadas e fomos aprendendo juntos”.
“Eu me sinto um pouco advogado da indústria mineral. Não há sustentabilidade em nossa sociedade sem a indústria mineral. Um automóvel elétrico usa seis vezes mais carga mineral do que um automóvel convencional. Parque eólica usa nova vezes carga mineral para construí-la e mantê-la do que uma termelétrica a gás natural”, explicou o professor Luís Marcelo Tavares.
Espelho das influências recebidas
O professor Leonardo Sales foi o premiado na categoria jovem docente e foi apresentado, de maneira muito bem-humorada por seu padrinho e colega de PEMM, professor Luís Henrique de Almeida, que brincou com o gosto de seu ex-aluno por sanduíches, refrigerantes e por futebol.
“Ele teve excelente rendimento na graduação e mostrou competência técnica e liderança como trainee na Gerdau. Ficou famoso como ‘As cinco falanges’ pelo tamanho de sua mão. Lá havia tudo o que ele gosta: chão de fábrica, poeira, calor e barulho”.
“Em 2008 retornou à Coppe para o doutorado, que defendeu em 2012. Ganhou o prêmio Marechal do Ar Casemiro Montenegro Filho, pela contribuição à nacionalização dos produtos para a indústria nuclear. Tornou-se professor e, na graduação, é considerado um professor ‘mamata’, ‘molezinha’” – caçoou, embora os alunos presentes ao auditório tenham discordado dessa facilidade.
“Leonardo foi chefe de departamento entre 2020 e 2022, justamente no período da pandemia, e explorou ao máximo os recursos tecnológicos e redes sociais para formatar aulas remotas, ajudou diversos colegas docentes, tirando dúvidas e mostrando caminhos. Sempre que alguém tem dúvida sobre como fazer uma aula online ou usar o Sistema Eletrônico de Informações (SEI), ele responde ‘pode deixar que vou fazer um videozinho explicando o que tem que fazer’”, elogiou.
Professor Luiz Henrique descreveu, ainda, o colega Leonardo Sales como um pesquisador que gosta de trabalhar em equipe, é muito querido pelos alunos, e desenvolve projetos em vários campos da ciência de materiais, desde grampos de estruturas inspirados em mordida de formiga, passando por análise de falhas de equipamentos, e desenvolvimento de ligas especiais como superligas de níquel e ligas de titânio para fins biomédicos.
Divertido com as observações jocosas do padrinho, professor Leonardo Sales foi sucinto e observou que a premiação “é um espelho de toda influência que temos durante a nossa vida, seja pela família, seja pela formação, pelos professores, em especial, aqueles que hoje são meus colegas. Minha formação passou pela indústria e o aprendizado com os professores, técnicos e alunos do PEMM. O resultado é construção baseada no espelhamento do que você aprende e com quem aprende. O desafio é grande de ser herdeiro desse legado”.
Massarani e Lobo Carneiro: por que homenageá-los?
A cerimônia deste ano contou com uma novidade. Os professores Claudio Habert (Programa de Engenharia Química) e Eduardo Fairbairn (Programa de Engenharia Civil), relembraram as trajetórias dos professores Giulio Massarani e Lobo Carneiro, explicando aos alunos o porquê de a instituição honrar a memória destes docentes, batizando as premiações com seus nomes.
Segundo o professor Habert, Giulio Massarani foi um exemplo de um moderno professor universitário de Engenharia e integrou o grupo que se organizou em torno do professor Alberto Luiz Coimbra, criador da Coppe.
“Massarani fez o seu mestrado em Houston (EUA) e voltou em 1963 para compor o corpo docente da primeira turma de pós-graduação em Engenharia do Brasil. Ele e Afonso Teles são os primeiros professores brasileiros a integrar o corpo docente dessa turma. A ideia de Coimbra era que seus pontas de lança absorvessem o que havia de mais moderno em termos de preparação de engenheiros. Vivendo em Houston, em torno da qual a indústria do petróleo se desenvolvia. Massarani rapidamente percebeu as mudanças curriculares, a importância da matemática, do cálculo, e isso causou uma revolução”, contou Habert.
Segundo Claudio Habert, Massarani era extremamente pragmático, sem nunca deixar de respeitar as contribuições teóricas clássicas, dizia que os alunos tinham que resolver problemas, encontrar soluções numéricas. “Ele foi meu professor de métodos matemáticos e até então eu não guardava boa impressão do ensino de matemática na Engenharia. Devo essa nova visão ao entusiasmo com que ele dava aula. Tradicionais no quadro, caligrafia impecável, cultivou o habito de manter suas aulas manuscritas e encadernadas
“Ele tinha percepção de que atrair e fomentar talentos desde cedo era necessário para a profissionalização e progresso da pesquisa no Brasil. Em 1978, inicia a Jornada de Iniciação Científica (JIC) no âmbito do Centro de Tecnologia (CT) e do Centro de Ciências Matemáticas e da Natureza (CCMN). Em 85, a JIC passa a ser realizada em toda a UFRJ, foi batizada com seu nome. Em 1993, criou a Escola Piloto do Programa de Engenharia Química, que oferece cursos de capacitação na hora do almoço e também recebeu seu nome. Precisamos contar às novas gerações quem foi Giulio Massarani, porque o homenageamos e continuaremos homenageando”, relembrou Habert, que qualificou Massarani como sendo um homo coppeano, simbolizando o projeto do professor Coimbra.
Professor Eduardo Fairbairn, por sua vez, descreveu o professor Lobo Carneiro, como “uma figura agradável, generosa e sensível. Era um personagem renascentista. Tinha múltiplas facetas. Foi até deputado federal pelo Partido Republicano Trabalhista (PRT, partido existente à época), participando da discussão da lei que instituiu a Petrobras. ‘Lobão’ era um visionário, um grande incentivador da computação, e por isso o supercomputador da Coppe leva o seu nome. Ele deu o pontapé inicial na história que temos com a Petrobras, na pesquisa de Engenharia offshore. Se hoje estou aqui é por causa dele, pois os grandes professores mudam nossas vidas”, enalteceu.
De acordo com Fairbairn, Lobo Carneiro, ganhou notoriedade internacional ao criar o essai brésilien, brazilian test ou brazilian splitting test. “O teste foi criado devido à necessidade de transladar uma igreja que estava no eixo de onde seria construída a avenida Presidente Vargas. A igreja seria transladada sobre rolos de concreto. Ele descobriu que havia relação entre a carga de compressão sobre o cilindro e sua ruptura por tração, facilitou enormemente os ensaios de tração em materiais e virou um bestseller internacional e foi nomeado pelos franceses de essai brésilien”, explicou o professor, que ao final recomendou o download do livro Engenharia da Transparência: Vida e obra de Lobo Carneiro.
“Nada mais importante que a homenagem feita pelos pares”
Diretor do Conselho Deliberativo da Coppe, professor Fernando Rochinha, destacou que a universidade se fortalece quando revisita antigos ritos acadêmicos, e citou o ex-diretor da Coppe, professor Luiz Pinguelli Rosa, falecido em março, que dizia “não há nada mais importante do que a homenagem feita pelos pares”.
O decano do Centro de Tecnologia (CT) da UFRJ, professor Walter Suemitsu, fez coro a Rochinha e lembrou que o ex-reitor da UFRJ, professor Aloísio Teixeira, dizia que a cerimônia que ele mais gostava era a de emerência. “Cerimônias assim mostram que nós reconhecemos o esforço, a qualidade acadêmica, a dedicação aos alunos”.
Na avaliação do diretor da Coppe, professor Romildo Toledo, o biênio foi marcado por muitas adversidades e os premiados conseguiram superar momentos muito difíceis, cenário nacional conturbado, o retorno ao trabalho presencial “ainda não foi pleno, não estamos ainda em um estado de normalidade”.
“Quero agradecer à diretoria acadêmica, à Lavínia e toda a equipe, não pelo evento de hoje, mas pelo trabalho do ano inteiro e também aos coordenadores de programas. O trabalho do corpo docente não acontece pelo trabalho individual e sim pelo trabalho coletivo, é um trabalho feito a muitas mãos. Precisamos de muitos agentes, agências de Estado, da universidade nos guiando e valorizando. A presença do vice-reitor mostra o apreço pelo desenvolvimento institucional”, reconheceu professor Romildo.
O professor Carlos Frederico Leão da Rocha avaliou a difícil conjuntura financeira das universidades neste final de ano e a perspectivas de dias melhores. “Precisamos olhar para a frente. Estamos saindo de um período muito difícil. Acredito que neste momento, os membros dessa banca devem ter mais recursos bancários do que a UFRJ”.
“Quando o Brasil fez o Reuni, o país perdeu a oportunidade de fazer uma mudança maior. Pegamos o que nós tínhamos e fizemos uma regra de três, só aumentamos, espelhamos o que tínhamos. Os economistas costumam dizer que no longo prazo tudo vai dar certo, mas Keynes (John Maynard Keynes, economista inglês, um dos mais influentes do século XX) dizia que em longo prazo todos estaremos mortos. Temos que ver como será o futuro e ele, certamente, não será uma repetição do passado. Temos uma perspectiva de crescimento do sistema universitário e não devemos repetir o passado”, concluiu o vice-reitor da UFRJ.
O evento contou com a participação do vice-reitor da UFRJ, professor Carlos Frederico Leão da Rocha; do decano do Centro de Tecnologia, professor Walter Sumietsu; do diretor da Coppe, professor Romildo Toledo; do presidente do Conselho Deliberativo, professor Fernando Rochinha; do presidente da CAD, professor Glauco Taranto; da diretora acadêmica, professora Lavínia Borges; do diretor-adjunto acadêmico, professor Marcello Campos; além dos professores premiados e seus respectivos padrinhos.
A cerimônia de entrega do Prêmio Coppe Mérito Acadêmico está disponível no canal da Coppe no YouTube.
- Lobo Carneiro