Startup da Coppe desenvolve biotecidos pulmonares para estudar a interação do novo coronavírus

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Data: 18/08/2021

A startup Gcell Cultivo 3D, da Incubadora de Empresas da Coppe/UFRJ, está desenvolvendo uma plataforma automatizada para fabricar biotecidos 3D, a partir de células pulmonares humanas, que propicie o estudo da interação do novo coronavírus. O objetivo é que a plataforma atenda a diversos cientistas nos estudos voltados para o mecanismo de entrada do Sars-CoV-2 no organismo; e à indústria farmacêutica na realização de testes de novos fármacos, candidatos a novos medicamentos. Confira o vídeo.

O projeto “Desenvolvimento de plataforma automatizada de produção de cultivo 3D de pulmão e a bioimpressão para o enfrentamento da covid-19” foi contemplado no edital de Subvenção Econômica à Inovação, da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), com financiamento de R$ 130.822,61. Para sua execução, a Gcell firmou um acordo de parceria com o Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), por meio da Diretoria de Metrologia Aplicada à Ciências da Vida, para utilizar a infraestrutura do Laboratório de Bioengenharia Tecidual (Labio). De acordo com a biomédica Leandra Baptista, sócia-fundadora técnica da Gcell, esta infraestrutura é crucial para o desenvolvimento do projeto, pois além de poderem utilizar os equipamentos básicos de manutenção do cultivo de células, os especialistas têm acesso à uma plataforma automatizada de pipetagem.

A partir desta plataforma do Inmetro já foi desenvolvido um protocolo que agora torna possível formar estes tecidos tridimensionais. De acordo com a biomédica da Gcell, a produção será automatizada e em larga escala. “É possível uma única placa de cultivo formar centenas desses tecidos, podendo chegar, em único dia, a milhares de tecidos construídos de forma tridimensional”, afirma Leandra, que também é professora de Ciências Biológicas da UFRJ.

De acordo com Leandra, a plataforma foi configurada, com uso de software, para funcionar como se fosse uma espécie de robô, que atua de forma automatizada utilizando as pipetas para dispensar os líquidos celulares nos recipientes. A biomédica explica que na configuração foi preciso levar em conta inúmeros detalhes, como o de calibrar a altura da peça que representa a mão de uma pessoa fazendo a pipetagem, e as características dos diferentes tipos de células.

“Para desenvolver no laboratório um tecido de pulmão 3D, você tem que utilizar a plataforma para plaquear, ou seja, identificar e separar os diferentes tipos de células que compõem um tecido natural, para depositar as que interessam no local adequado de forma a obtermos a estrutura tridimensional. Durante este processo de recriação de um tecido, é preciso organizar as células que estão em suspensão para podermos fazer a combinação necessária para gerar o tecido”.

É possível uma única placa de cultivo formar centenas desses tecidos, diz Leandra Baptista

O próximo passo, considerado como mais complexo, é a bioimpressão de um pulmão. De acordo com Leandra, o processo é realizado a partir de centenas de miniaturas dos tecidos de, aproximadamente, 300 micrômetros cada. As células são tratadas para que, ao serem agrupadas, formem os tecidos pulmonares idênticos ao de um ser humano. No futuro, tais tecidos terão que ser configurados para gerar um pulmão com formato bem próximo ao real. Tal missão poderá ser agilizada pela seleção da Gcell no Programa Global Start-up Servive, da ISC3 – International Sustainable Chemistry Collaborative Center, que dará à empresa acesso a um valioso banco de dados relacionados à química sustentável e a ferramentas computacionais avançadas, além de troca de informações restritas com outras startups internacionais que atuam no mesmo ramo.

O desenvolvimento da plataforma é consequência de um outro projeto da qual a Gcell participa como startup integrante, com a proposta de biofabricar esferoides teciduais para estudos de combate ao novo coronavírus. Contemplado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do estado do Rio de Janeiro (Faperj), na Chamada “Ação Emergencial Projetos para Combater os Efeitos da Covid-19 – Parceria Faperj/Ses – 2020”, o projeto é coordenado pelo professor Wanderley de Souza, do Instituto de Biofísica da UFRJ, e conta com a parceria do Labio do Inmetro.

De acordo com Wanderley, as análises por microscopia eletrônicas dos cultivos celulares tridimensionais já foram realizadas no Laboratório de Ultraestrutura Celular Hertha Meyer, por ele coordenado. Agora, os pesquisadores já estão iniciando os estudos da interação com o vírus para que se possa substituir gradativamente o modelo de células em monocamada, que vinha sendo utilizado, pelo modelo tridimensional com células pulmonares, que é mais próximo da realidade do pulmão.

O professor diz que durante os testes iniciais, utilizando os tecidos tridimensionais, no Laboratório de Ultraestrutura Celular do Instituto de Biofísica e no Centro Nacional de Biologia Estrutural e Biomagens (Cenabio), da UFRJ, já foi possível constatar que o Sars-CoV-2 infecta as células, causando lesões. “O modelo está se mostrando apropriado. Caso não houvesse esta tecnologia estaríamos fazendo testes com cultivos mais simples, de menor precisão, e mais distante do modelo do pulmão”, afirma Wanderley

Para realizar os testes, os pesquisadores utilizam equipamentos de microscopia eletrônica confocal para fluorescência, microscopia eletrônica de varredura e microscopia eletrônica de transmissão. Os equipamentos permitem ver as lesões e o próprio vírus. Wanderley diz que este potencial de visualização é fundamental, pois além de comprovar as alterações que os vírus causam, tem que se comprovar também a sua presença no tecido pulmonar.

“No laboratório já vínhamos trabalhando com cultivos de células neuronais, mas não com as de pulmão que é por onde, a princípio, ocorre a infecção do vírus. Iremos pesquisar não somente as células pulmonares, mas também as células de toda a cadeia respiratória, como as do brônquios e traqueias, por exemplo. Uma vez comprovada sua eficácia durante os testes, o modelo poderá ser disponibilizado e utilizado não somente para avaliar os impactos da covid-19, mas também para outras doenças pulmonares”, conclui o professor do Instituto de Biofísica da UFRJ.

Sobre a Gcell

A Gcell Cultivo 3D é uma startup de biotecnologia que ingressou na Incubadora de Empresas da Coppe, em 2020, um ano após a sua fundação. A empresa foi idealizada pela biomédica Leandra Baptista, professora de Ciências Biológicas da UFRJ e pesquisadora premiada, com vasta experiência nas áreas de Biologia de Células-Tronco Mesenquimais, Microambiente do Tecido Adiposo e Obesidade, Engenharia de cartilagem e osso, Cultivo de células 3D e bioimpressão.

As tecnologias de cultivo de células em 3D, em particular os esferoides e organoides, emergem como uma poderosa ferramenta para um real mimetismo de tecidos saudáveis e tumorais, funcionando como metodologias alternativas ao uso de animais em pesquisa. A Gcell faz parte dos grupos internacionais que atuam de forma crescente para a criação de novos métodos relevantes capazes de substituir os animais. Os esforços científicos neste sentido estão centrados nos métodos alternativos in vitro de alta complexidade. ​

Graduada em Ciências Biológicas e doutora em Ciências Morfológicas, pela UFRJ, Leandra Baptista foi orientada pelo professor Radovan Borojevic, que a inspirou tanto como cientista como empreendedora. Atuou como bolsista de pós-doutorado na Excellion, empresa fundada pelo seu orientador e o primeiro laboratório de extensa manipulação de células para fins terapêuticos do país, certificado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A união de todo o conhecimento e experiências acumulados ao longo de sua carreira dedicada à Ciência e da sua paixão para a translação de avanços recentes para a sociedade, fez com que Leandra se unisse a um grupo especializado e multidisciplinar para criar a empresa. 

Com pouco tempo de fundação, a Gcell já foi contemplada em outros dois editais da Faperj. Além disso, a Gcell foi selecionada para participar de dois importantes programas, em 2020, com foco na internacionalização: o Programa de Aceleração e Internacionalização de Negócios de Alto Impacto em Bioeconomia (ProinterBio), do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), e o Programa Academia-Industry Training (AIT) 2020-2021, uma iniciativa da swissnex Brazil, University of St.Gallen, Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), e Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), que tem o objetivo de conectar promissores pesquisadores-empreendedores com a indústria, além de permitir a interação entre pesquisadores internacionais.

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