Professora da Universidade de Virgínia critica influência de empresas de energia na formulação de políticas ambientais nos EUA

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Data: 06/06/2017

No momento em que a relação entre empresários e políticos no Brasil vem sendo alvo de ações judiciais e de debates na sociedade, a professora Vivian Thompson, da Universidade de Virgínia, falou em palestra na Coppe/UFRJ, dia 31 de maio, sobre a influência das empresas de carvão e de eletricidade na formulação de políticas ambientais, tornando público o poder das indústrias sobre os governantes nos EUA.  O evento foi promovido pelo Programa de Planejamento Energético da Coppe.

Professora de Ciências Ambientais e Políticas, Vivian foi membro do Conselho de Controle da Poluição Atmosférica do estado de Virgínia, de 2002 a 2010. Este ano a pesquisadora lançou o livro “Climate of Capitulation: an Insider’s Account of State Power in a Coal Nation” (*), tema de sua palestra na Coppe, no qual mostra os entraves para estabelecerem-se limites de poluição para a indústria de carvão.

Thompson criticou a tendência de políticos estaduais e funcionários públicos em favorecer as empresas locais de carvão e de energia. A professora analisou onze estados do Sul, como Texas, Kentucky e Virgínia, que utilizam carvão para a geração de energia e que demonstram grande vulnerabilidade ao clima de capitulação.

“Tanto democratas quanto republicanos se curvam ao lobby. Os padrões de financiamento de campanha no plano estadual revelam a grande predominância das empresas de energia. E a cultura política local tradicionalista, aliada à legislatura não profissionalizada, desprovida de poder analítico independente, leva à inércia, à manutenção de normas brandas com as indústrias poluidoras”, criticou Vivian.

Mas, segundo a pesquisadora, isso são tendências, não inevitabilidade. “É possível resistir ao clima de capitulação, sobretudo quando se conta com cidadãos dedicados a defender limites mais baixos de poluição”, acrescentou.

“Administração Trump está 30 anos defasada: maioria dos eleitores americanos apoia medidas de restrição à emissão de CO2”

“As pessoas não votaram no ar sujo, por isso a resistência ao Trump vai continuar, principalmente se ele decidir se posicionar contra o Acordo de Paris”, alertou a professora Vivian Thompson

No que tange à política ambiental, segundo Thompson, os políticos norte-americanos não representam seus eleitores, mas os interesses dos financiadores de seus partidos. Um dia antes do presidente Donald Trump, do Partido Republicano, ter anunciado a retirada dos EUA do Acordo de Paris, a pesquisadora afirmou em sua palestra na Coppe que a maioria do eleitorado republicano é favorável ou aceita reduzir as emissões de C02 e aumentar o uso de fontes renováveis. Em 2003, dois em cada três eleitores republicanos apoiavam medidas de restrição de emissão de CO2. Em 2016, 76% do total de eleitores, 60 % dos republicanos e 90% dos democratas. Este consenso incluía acordos internacionais, antes mesmo das negociações do Acordo de Paris: 85% dos democratas e 64% dos republicanos concordavam que era importante chegar a um acordo”, relatou Vivian.

A postura cética do atual governo americano em face ao aquecimento global, as mudanças climáticas e a necessidade de contê-las por meio de investimentos em fontes renováveis de energia, tem levado ao recrudescimento da oposição ao recém-eleito presidente Donald Trump. “Os cidadãos americanos já decidiram que devemos reduzir as emissões, investir em energia limpa e cumprir os acordos firmados com a comunidade internacional. É como se a administração Trump não lesse notícias, nem artigos, como se estivesse 30 anos defasada. A tendência de investimentos nos Estados Unidos é em energia renovável, e não em combustíveis fósseis. Em 2016, as pessoas não votaram no ar sujo, por isso a resistência ao Trump vai continuar, principalmente se ele decidir se posicionar contra o Acordo de Paris”, alertou a professora, antecipando, na véspera, as consequências ao anúncio feito pelo presidente norte-americano, dia 1º de julho, de retirar os EUA do referido acordo.

Paralisia política contra o retrocesso ambiental

Eleita para o Conselho de Controle da Poluição Atmosférica do estado de Virgínia, em 2002 (e reeleita em 2010), Vivian Thompson enfrentou, na prática, o antagonismo sistemático e organizado das empresas poluidoras ao trabalho em prol de normas ambientais mais rigorosas, dos congressistas estaduais, do Departamento de Qualidade Ambiental, e mesmo do governador Tim Kaine (2006-2010), que no ano passado foi candidato a vice-presidente dos Estados Unidos, em chapa encabeçada pela senadora Hillary Clinton.

Na cidade de Alexandria, a empresa Mirant Power Plant mantinha uma termelétrica a carvão, com chaminés baixas, devido ao tráfego aéreo do aeroporto de Washington. O Conselho avaliou os efeitos da fumaça emitida pela usina na qualidade do ar. O estudo concluiu que as emissões causavam violações alarmantes das normas nacionais estabelecidas pela Agência de Proteção Ambiental para material particulado, dióxido de enxofre, dióxido de nitrogênio.

Como o governo não tomou nenhuma medida concreta, o Conselho deixou o seu papel tradicionalmente passivo. “Entre nossos opositores estavam a empresa Mirant, legisladores estaduais, funcionários do Departamento de Qualidade Ambiental (DQA) e do governo democrata de Tim Kaine. Mas os cidadãos pressionaram a nosso favor e, por fim, o tribunal decidiu favoravelmente às normas estritas estabelecidas pelo Air Board, menos da metade das normas estabelecidas pelo DQA”, informou a professora.

De acordo com Vivian, o governador e os congressistas estaduais conseguiram, por meses, impedir a imposição de rigorosos limites de poluição à empresa Mirant e após a adoção dos mesmos, eles se articularam para diminuir os poderes do Conselho e transferir parte de suas atribuições ao Departamento de Qualidade Ambiental. Daí a professora ter intitulado um dos capítulos de seu livro como “Nenhuma boa ação fica impune”.

Cético em relação às mudanças climáticas e no afã de gerar empregos a qualquer custo, o governo de Donald Trump tem buscado reduzir as regulações ambientais.  É o caso até mesmo daqueles que deveriam zelar pelo meio-ambiente. Segundo Vivian, o administrador da Agência de Proteção Ambiental (EPA, em inglês), Scott Pruitt, tem buscado enfraquecer o Clean Power Plan, a política ambiental americana, que traz regulamentos para reduzir emissões de CO2, dióxido de enxofre e dióxido de nitrogênio.

“Mas, não vai ser fácil mudá-la, pois os tribunais confirmaram que o Clean Power Plan é nossa lei para as mudanças climáticas. Além de convencer o Congresso e enfrentar ações judiciais, Trump precisa nomear de 20 a 30 funcionários na EPA para mudar a política ambiental vigente, o que ele tem demorado a fazer. A paralisia política costuma ser ruim, mas nesse caso tem o efeito positivo de restringir as ações de Trump contra os acordos climáticos”, tranquilizou a professora.

(*) Climate of Capitulation: an Insider’s Account of State Power in a Coal Nation, publicado pela MIT Press este ano, já está à venda no site da Amazon, por US$ 28 em capa dura, ou US$16,50 em Kindle. O livro também pode ser alugado, por quatro meses, por US$12, no site da própria editora.