Acordo de Paris não será suficiente para conter elevação da temperatura do planeta
Planeta COPPE / Planejamento Enérgico / Notícias
Data: 29/06/2016
Artigo publicado na edição da revista Nature que circula, amanhã, 30 de junho, alerta que as propostas apresentadas pelos representantes de 195 países, em dezembro de 2015, na COP-21, em Paris, não serão suficientes para conter a elevação da temperatura do planeta abaixo de 20C, em relação aos níveis pré-industriais. Essa é uma das principais conclusões do estudo, assinado por 10 especialistas de diferentes países, entre eles o brasileiro Roberto Schaeffer, professor do Programa de Planejamento Energético da Coppe/UFRJ.
Segundo Roberto Schaeffer, o estudo conclui que serão necessárias propostas mais ousadas para que se tenha uma chance razoável de atingir a meta climática, acordada em Paris, para manter a elevação da temperatura do planeta em até 20C até o final do século.
No artigo “Paris Agreement climate proposals need a boost to keep warming well below 20C”, os autores fazem uma abordagem inédita sobre o alcance das INDCs (pretendidas contribuições nacionalmente determinadas) apresentadas pelos governos de 187 de um grupo de 195 países em preparação para o Acordo de Paris. A expectativa era de que as metas voluntárias de redução de emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE), que deverão ser implantadas no período 2020 a 2030, seriam suficientes para manter a elevação média da temperatura em até 20C e, dependendo de alguns ajustes, em até 1,5 0C. Porém, os especialistas alertam que as INDCs não são suficientes para manter, em 2 0C, a meta de elevação da temperatura do planeta até 2100.
Elevação da temperatura em diferentes cenários
O estudo, que incorpora uma série de análises probabilísticas, com previsões sobre a elevação da temperatura diante de diferentes cenários, considera as emissões de CO2 diante de quatro cenários: sem nenhum esforço para redução de emissões, seguindo as políticas já adotadas pelos países, seguindo as metas expressas nas INDCs incondicionais, e seguindo as chamadas INDCs condicionais, nas quais determinados países condicionam as reduções a algum tipo de ajuda.
Para cada um dos cenários apresentados, o estudo aponta a elevação média esperada da temperatura segundo diferentes probabilidades de tal elevação não ser excedida. Para isso, utilizam três faixas de percentuais. O artigo mostra, por exemplo, que se o cenário de INDC incondicional for mantido, a probabilidade de a elevação da temperatura em 2100 não exceder a faixa de 2,60C a 3,10C é de 50%. Quanto maior a probabilidade de um determinado cenário se confirmar, maior será a temperatura em 2100.
Dessa forma, considerando o mesmo cenário de INDC incondicional, a probabilidade de a elevação da temperatura em 2100 não exceder os 2,90C a 3,40C é de 66%. Caso seja considerada a probabilidade de 90%, a elevação da temperatura no fim deste século não deverá exceder a faixa que vai de 3,50C a 4,20C. Assim, na média, os pesquisadores trabalham com uma faixa de elevação da temperatura, que vai de 2,90C, em um cenário menos conservador (50%), até 3,90C, no cenário mais conservador (90%).
Diante desses cenários, será preciso reduzir as emissões propostas nas INDCs e fazer isso antes do que se imaginava. “Se esses ajustes forem realizados somente após 2020, dependendo da situação, poderá ser tarde demais”, explica o professor Roberto Schaeffer. Segundo o professor, caso as ações para redução demorem a ser feitas, após 2020 elas poderão não mais ser suficientes para manter a elevação média da temperatura do planeta em até 20C.
Análise mais aprofundada
O professor do Programa de Planejamento Energético da Coppe ficou responsável por fazer parte da quantificação das INDCs apresentadas por 187 países. Um trabalho minucioso, uma vez que nem todas as INDCs são tão claras quanto a do Brasil, no que se refere às suas reduções voluntárias de emissões. Foi preciso fazer um exaustivo trabalho para uniformizar as INDCs para que depois esses números pudessem receber o tratamento probabilístico, que é um dos diferenciais do artigo.
No caso brasileiro, por exemplo, ficou clara a intenção do governo em reduzir as emissões para 1,3 giga toneladas (Gt) de CO2 equivalente em 2025, e de indicar um valor de 1,2 Gt em 2030. Em 2005, o país emitiu cerca de 2,7Gt. Boa parte dessa redução pretendida está relacionada à redução do desmatamento no país, o que já vem se verificando.
O artigo apresentado à Nature deriva, em parte, de um trabalho anterior de alguns dos autores, entre eles o professor Roberto Schaeffer, realizado para o UNEP Gap Report 2015, publicação científica coordenada pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), cuja mais recente edição foi finalizada em novembro passado.
Com uma série de novas análises, o artigo da Nature faz uma avaliação ainda mais aprofundada do alcance das INDCs para a elevação da temperatura. “Se no UNEP Gap Report 2015 já apontávamos que as INDCs não são suficientes, agora o artigo aprofunda o estudo anterior através de uma série de análises probabilísticas relacionadas à elevação da temperatura”, explica Schaeffer.
Se tomado a sério, o artigo publicado na Nature mostra que se os países signatários do Acordo de Paris quiserem mesmo manter a elevação da temperatura do planeta sob controle, estes terão muita discussão e muito trabalho pela frente para aumentarem ainda mais suas ambições de reduzir suas emissões de CO2 para bem além do proposto em suas INDCs.