Resíduos e mobilidade estão entre os desafios das grandes cidades
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Data: 17/06/2012
O Brasil economizaria R$ 32 bilhões por ano, se todos os resíduos fossem reaproveitados. O grande potencial do aproveitamento energético de resíduos foi destacado pelo pesquisador do Instituto Virtual Internacional de Mudanças Globais (Ivig) da Coppe/UFRJ, Luciano Basto, no 3º dia do evento “O futuro sustentável – Tecnologia e inovação para uma economia verde e a erradicação da pobreza”, realizado em 15 de junho. “Se fosse computada a economia com a água no processo produtivo, o dinheiro economizado subiria para R$ 40 bilhões”, disse Basto, que coordenou o projeto que deu origem à empresa Usina Verde, instalada no campus da UFRJ.
Hoje, 42% dos resíduos brasileiros têm uma disposição inadequada, segundo a professora do Programa de Planejamento Energético da Coppe, Alessandra Magrini. Ela ressaltou, ainda, que muito lixo ainda não é coletado nas cidades e que 32% dos recicláveis são dispersos de qualquer jeito. “Cada brasileiro produz 400 quilos de resíduos por ano, e o número tende a crescer, com mais consumo. Nos países ricos, como os EUA, onde o consumo já foi de mil quilos por pessoa, a produção chega a 750, com a adoção de mudanças de hábitos.”
Para o presidente da Associação de Catadores de Material Reciclável de Jardim Gramacho, Tião Santos, o mundo ficou pequeno para tanto lixo. “A reciclagem é a saída para diminuir o impacto ambiental e social. No Brasil, que ainda não chegou ao estágio de ter apenas aterros sanitários, a reciclagem surgiu no combate à pobreza. É preciso romper o preconceito diante do lixo, mostrar que reciclá-lo não é coisa de pobre, mas de gente inteligente”, ressaltou, no painel “Consumo, resíduos e reciclados: o luxo e o lixo”.
Alessandra Magrini acredita que uma saída é a redução da produção de resíduos, com princípios de química, e engenharia verde, otimizando plantas industriais: “Também podemos melhorar os produtos, com ecodesign e a previsão de que possam ser reciclados em partes. Uma ecologia industrial, com sinergia, pode proporcionar a troca de resíduos reaproveitáveis entre empresas. Já estamos fazendo isso em distritos industriais do Estado do Rio.”
Para Luciano Basto, que também é integrante do Painel Brasileiro sobre Mudanças Climáticas, a coleta seletiva tende a crescer, com a maior conscientização ambiental. “O avanço é inegável. Na Rio 92, estávamos no Aterro do Flamengo expondo uma lixeira com quatro compartimentos. Hoje a Coppe mostra como evoluiu a tecnologia brasileira na área, o que torna o nosso desafio maior.”
Na Rio 92, Tião Santos tinha 13 anos e catava lixo em Gramacho desde os 11, com sete irmãos. “Lembro de tudo, principalmente de que a conferência mudou nossas vidas para melhor. Logo depois, os lixões tiveram que se adequar para virar aterros sanitários, com canalização do gás metano e cobertura de argila sobre o lixo. Veio também a legislação pela erradicação do trabalho infantil. Aos 15, tive que sair de lá e fui trabalhar como açougueiro”, contou Tião.
Para ele, a percepção sobre a conferência também evoluiu. “Antes, a cidade estava com a segurança reforçada para receber líderes mundiais e um pessoal no Aterro do Flamengo que parecia meio doidão. Agora, com a Rio+20, a preocupação com o planeta é um fato para a maioria. De lá para cá, a reciclagem cresceu muito e os lixões começaram a acabar”, disse.
Com o fechamento do depósito de Gramacho, 60 catadores trabalham na cooperativa e outros 500 estão cadastrados para iniciar o trabalho com reciclagem. Tião lembrou que continua a luta para a valorização do profissional: “Com a economia em crescimento, o Brasil gerará mais resíduos e será preciso evitar o desperdício por falta de reciclagem. Mas o sistema tem que deixar de ser predatório, desumano e desigual. No retorno financeiro, nem 10% chegam ao catador.”
Uma alternativa para a geração de renda pode estar no uso da reciclagem de resíduos na construção civil, diante da expansão das obras de infraestrutura no Brasil. O engenheiro Romildo Toledo, professor do Programa de Engenharia Civil da Coppe, falou dos projetos desenvolvidos para a substituição parcial do cimento no concreto, com cinzas agroindustriais a partir de fibras de plantas, além do reaproveitamento de resíduos de demolição e cinza de lodo de esgoto. “Depois da água, o concreto é o produto mais utilizado nas construções, reunindo brita, areia e cimento. E 5,7% das emissões de CO2, principal responsável pela mudança climática, vêm do cimento. O concreto ecológico ajuda, assim, a capturar CO2″, destacou.
Já o coordenador do Laboratório de Modelagem, Simulação e Controle de Processos do Programa de Engenharia Química da Coppe, José Carlos Pinto, falou do reaproveitamento do plástico. Lembrando que o produto é sempre apontado como vilão ambiental, ele frisou a importância do reaproveitamento: “Se o plástico pode durar 200 anos, a degradabilidade não é uma desvantagem. Ele pode ser reaproveitado e reciclado, com a química verde, com viabilidade técnica e econômica.”
Uso excessivo de carros particulares é gargalo para mobilidade urbana
O Brasil precisa com urgência adotar mais programas de incentivo ao transporte coletivo e usar menos os veículos particulares. Essa foi a conclusão a que chegaram os participantes do painel “Mobilidade e Transporte Sustentável” o segundo do dia, como parte das conferências “O Futuro Sustentável – Tecnologia e Inovação para uma Economia Verde e a Erradicação da Pobreza”.
De acordo com o professor do Programa de Planejamento Energético da Coppe, Roberto Schaeffer, as cidades privilegiam o transporte privado em detrimento do público. “O maior gargalo da mobilidade urbana e do transporte sustentável está no uso excessivo dos carros particulares. O aumento das emissões é uma das consequências da falta de investimento em transporte público”, sentenciou.
O professor do Programa de Engenharia de Transportes da Coppe, Márcio D´Agosto, reforçou o discurso ao afirmar que 28% do consumo final de energia do Brasil estão concentrados no transporte rodoviário.
“Além da questão da mobilidade urbana, o transporte rodoviário é um indutor do processo de poluição. Quanto mais carros tivermos circulando nas ruas, maior será o consumo de combustível e a emissão de dióxido de carbono e de outros poluentes. A sustentabilidade está apoiada em três pilares: o desenvolvimento econômico, o desenvolvimento social e a preservação ambiental. Se os três não estiverem juntos, nada acontece”, destacou D´Agosto.
O professor citou ainda um trabalho desenvolvido por alunos e pesquisadores da universidade no qual foi constatado que se a população do Rio de Janeiro deixasse de usar veículos particulares e utilizasse mais ônibus, por exemplo, o consumo de energia na cidade cairia em até 10 vezes. “Nós não temos como dimensionar quanto gastamos exatamente de energia hoje só com os carros particulares. Mas chegamos a essa conclusão levando em conta que, em média, um automóvel percorre dez quilômetros com um litro de combustível transportando apenas uma pessoa, enquanto um ônibus percorre 2,5 quilômetros por litro, com 60 pessoas”.
Os dados desse estudo também foram apresentados ontem a representantes dos governos estadual e municipal durante palestra do professor no evento Megacidades, no Parque dos Atletas. “O Brasil tem condições de produzir combustíveis mais limpos a curto prazo e a Coppe está acompanhando esse processo, procurando desenvolver tecnologias que possam auxiliá-lo”, afirmou D´Agosto.
O debate ganhou força com a participação do professor do programa de Engenharia de Transportes da Coppe, Rômulo Orrico, para quem a mobilidade urbana é um direito do cidadão. “Sofremos com o desperdício de espaço. O espaço público é usado de forma desordenada. A ideia de que tudo acontece no Centro da cidade é um erro. No Rio, por exemplo, 70% das pessoas que estão nos ônibus que passam pela Avenida Brasil descem antes da Rodoviária e todos os ônibus vão até o Centro”, destacou o especialista.
A diretora do projeto Cidades para Pessoas, a jornalista Natália Garcia, contou experiências pessoais para defender a substituição dos veículos pelas bicicletas. Para a jornalista, a mobilidade urbana deve levar mais em conta a circulação das pessoas do que a dos carros. “É preciso trazer a escala humana para as cidades e para os projetos de mobilidade urbana. Hoje no Brasil, a sinalização de trânsito se “comunica” com quem está de carro e muito pouco com quem está a pé”, criticou Natália.
O painel contou ainda a participação especial de Marcel Steps, professor de Urbanismo na Bélgica e secretário geral do Instituto para as Cidades em Movimento (IVM). Em sua palestra, Steps destacou que não se deve privilegiar um único tipo de transporte.
Plástico: vilão ou aliado?
Chega às livrarias na próxima semana o livro Impactos Ambientais Causados pelos Plásticos – Uma discussão abrangente sobre os fatos e os dados científicos. Organizado pelo professor José Carlos Pinto, coordenador do Laboratório de Modelagem, Simulação e Controle de Processos do Programa de Engenharia Química da Coppe, a publicação foi lançada oficialmente ao final das conferências do dia 15 de junho.
Uma das propostas do livro, da editora E-papers, é desmistificar a ideia de que o plástico é prejudicial ao meio ambiente porque demora 200 anos para se degradar. “É um equivoco enorme acreditar que a não degradação dos plásticos é ruim. A degradação gera a emissão de CO2 e gás metano. O problema não está no fato do plástico não se degradar, está no desperdício. Temos que criar meios para aumentar o ciclo de vida desse material, reaproveitar, reutilizar e reaproveitar mais”, enfatizou José Carlos durante palestra do painel Consumo, Resíduos e Reciclados: o luxo e o lixo.
Além do professor José Carlos Pinto, são autores do livro Alessandra Magrini, Caio Kawaoka Melo, Carlos Castor, Carolina Gaioto, Dirceu Pereira dos Santos, Grazielle Borges, Isaías da Silva Rosa, Jorge Juan Soto Delgado, Márcio Nele de Souza, Maria Clara Brandt, Paula Naomi, Príamo Albuquerque Melo Jr., Ricardo Aderne e Sônia Vasconcelos.