Nature: Artigo com coautoria de professora da Coppe mostra os impactos de ondas de calor nos transportes e usuários no mundo
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Data: 08/08/2024
Artigo publicado na Nature nesta segunda-feira, dia 5 de agosto, revela que as ondas de calor estão ocasionando derretimento de estradas, danos em pneus, e deformação de trilhos e, assim, interrompendo viagens em vários países do mundo. O estudo, que tem entre os oito autores a professora Andrea Santos, do Programa de Engenharia de Transporte (Pet) da Coppe/UFRJ, a única do Brasil, mostra também que as populações mais vulneráveis são as mais afetadas em relação à mobilidade, devido ao calor.
Intitulado We need to prepare our transport systems for heatwaves — here’s how, o artigo ressalta que, neste ano, o tráfego na Índia foi interrompido pelo derretimento das superfícies das estradas e que, no verão passado, passageiros de ônibus em Houston (Texas-EUA) tiveram que esperar em abrigos de ônibus quentes o suficiente para deixar alguns deles doentes. Além disso, durante a onda de calor de 2022 no Reino Unido, dezenas de voos foram interrompidos pelo derretimento das pistas e a circulação dos trens foi atrasada devido a deformidade em trilhos.
Tais problemas aumentarão à medida que o mundo se aquece. Como exemplo, os autores citam que até 2050 a Espanha poderá enfrentar até 500 casos de encurvamento de trilhos a cada ano, em comparação com 20 esperados em 2025. Citam também que até 2100, os pavimentos em New Hampshire (EUA) poderão precisar ser substituídos a cada quatro anos, enquanto atualmente o tempo necessário é de 16 anos.
Coordenadora do Laboratório de Transportes Sustentável (LabTS) do Pet/Coppe, Andrea Santos, que é especialista em transportes e mudanças climáticas, diz que no Brasil os impactos ainda não são mapeados, mas que é importante entender o risco de altas temperaturas e das ondas de calor, e como essas já afetam e irão afetar o sistema de transportes e os seus usuários. Contudo, ressalta que a população já vem sendo impactada e que é urgente promover medidas de adaptação.
Os efeitos das ondas de calor serão sentidos de forma desigual, com as comunidades desfavorecidas sendo as mais afetadas. De acordo com os autores no Oregon (EUA), entre 2012 e 2017, o número de pessoas que utilizaram ônibus em dias muito quentes, com temperatura de 30 °C ou mais, caiu 1,6% em bairros de baixa renda, 1% em bairros de renda média e quase nada em áreas de alta renda. Por isso, frisam que governos, operadores de ônibus, trens e as cidades devem preparar, urgentemente, os sistemas de transporte para um futuro mais quente. Mas, os especialistas alertam que os esforços, até o momento, têm sido inadequados, pois apesar de pouco mais de 160 países mencionarem “transporte” em suas políticas de adaptação ao calor extremo, poucos progrediram do planejamento para a implementação. Isso, devido à falta de financiamento, priorização, coordenação, conhecimento técnico e capacidade, bem como à incerteza sobre o que o futuro reserva.
A desigualdade entre os impactados incluem famílias de baixa renda, mulheres, idosos e pessoas não brancas e/ou com deficiência. Todos esses serão afetados desproporcionalmente por ondas de calor. Os autores alertam que, em 2018, por exemplo, 20% das mulheres cancelaram viagens de metrô em Déli por causa do calor extremo, em comparação com cerca de 10% dos homens. De acordo com eles, as mulheres podem ser mais vulneráveis ao calor extremo do que os homens, devido a diferenças fisiológicas, normas culturais ou responsabilidades. No entanto, ressalvam que mais pesquisas são necessárias para entender essas disparidades.
“Para abordar a desigualdade de calor, planejadores e tomadores de decisão devem se envolver com comunidades marginalizadas para entender seus desafios e preocupações específicos e incorporar a contribuição em estratégias de calor. Campanhas generalizadas de plantio de árvores e incentivos financeiros para telhados verdes, por exemplo, podem melhorar as condições de vida nas cidades para todos”, defendem.
Os especialistas também avaliaram os impactos econômicos do aquecimento, e a consequência é que até o final do século, os custos anuais de operação e manutenção de estradas e ferrovias na União Europeia e no Reino Unido devem aumentar em € 0,9 bilhão (cerca de R$ 5,6 bilhões), em comparação a 2016, caso haja 1,5 °C de aquecimento global acima dos níveis pré-industriais. Caso tal aquecimento seja de 4 °C, os custos poderão ser de € 4,8 bilhões (R$ 29,4 bilhões) ao ano’.
Para fortalecer a resiliência ao calor dos sistemas de transporte, os especialistas propõem um roteiro, de forma que, em curto e médio prazos, os operadores de transporte devem avaliar os riscos climáticos e a viabilidade de várias soluções e implementar algumas opções de “baixo arrependimento” para melhorar a resiliência a condições climáticas extremas. Já a longo prazo, os atores propõem estratégias com projeções para melhorar a resiliência do transporte de forma constante conforme as mudanças das condições.
“Este roteiro reflete as deliberações de um painel de especialistas em infraestrutura de transporte e calor extremo, convocado com financiamento do órgão Global Facility for Disaster Reduction and Recovery”, avaliam, acrescentando que o transporte deve ser incorporado em todos os esforços relacionados a ondas de calor.
Dada a incerteza sobre a extensão e os impactos das mudanças climáticas, os especialistas dizem que governos e cidades precisam desenvolver “kits de ferramentas de resiliência” para manter o setor de transporte funcionando em condições extremas. Eles propõem soluções tecnológicas, como a instalação de sensores de temperatura e sistemas de monitoramento ao longo das redes de transporte, especialmente ao redor das partes mais vulneráveis. Como exemplo, destacam as seções expostas de trilhos ferroviários e a infraestrutura subterrânea com ventilação precária. Eles explicam que a combinação de sensores de temperatura com tecnologias de Internet das Coisas (IoT) pode permitir o monitoramento em tempo real das condições. Isso permitiria um planejamento aprimorado para manutenção, bem como respostas locais e dinâmicas, impondo, por exemplo, restrições de velocidade para melhorar a segurança.
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