Pesquisa da COPPE Revela: Cariocas Preferem as Bicicletas
Planeta COPPE / Engenharia de Transportes / Notícias
Data: 23/11/2000
A paisagem se desloca na velocidade do vento. A sensação é de liberdade. A filosofia, simplicidade e eficiência. Uma nova seita? Quem apostou nessa tese errou. Trata-se simplesmente de um senso comum entre os 397 ciclistas cariocas entrevistados pelo engenheiro de tráfego, Yang I Ti, para sua tese de mestrado defendida na COPPE. Uma descrição que, por si só, explica o porquê mais de 60% deles gostariam de utilizar o veículo como principal meio de transporte. Papo de carioca? Pode ser. Mas os números são implacáveis e não se restringem ao Rio de Janeiro. Para os céticos “automoviciados” aí vai a estatística. No Brasil há mais bicicletas do que carro. A proporção é de 37 para 33 milhões. Se os brasileiros resolvessem, ao mesmo tempo, tirar suas bicicletas da garagem, em minutos instauraríamos uma nova república, a da China tropical.
No Rio de Janeiro, 1,3 % das viagens são feitas sobre este veículo leve. E este percentual, segundo Yang, poderia ser muito maior mas vários obstáculos inviabilizam esta opção, entre eles a falta de segurança no trânsito, a ausência de uma política de projetos de ciclovias voltados para a utilização diária e a própria falta de hábito, cultura.
Perfil da tribo
Mas afinal, quem são os ciclistas cariocas? A pesquisa, que redundou na tese defendida por Yang na COPPE, denominada “Percepção de Risco: O ciclista em Relação ao Sistema Viário Urbano”, sob a orientação da Professora do Programa de Engenharia de Transportes, Marilita Braga, não traduz o perfil mas dá algumas dicas sobre os integrantes desta tribo. Trata-se de um território com predominância masculina, 67% homens e 33% mulheres. A média de idade gira em torno dos 28 anos. Sobre este dado Yang faz uma ressalva, explicando que o ciclismo abrange adeptos de diversas faixas etárias, de 10 a 70 anos. O mais velho que entrevistou durante a pesquisa, com 76 anos, estava “inteiraço” – garante. Já no que refere-se ao item segurança, a pesquisa evidencia uma contradição entre a teoria e a prática. Embora a maioria tenha enfatizado a importância deste fator, 90% confessou que não usa capacete, o que mostra que a imprevidência não é prerrogativa do poder público. Grande parte, precisamente 70%, desconhece a legislação sobre o uso do veículo, em vigor desde a década de 60. “O ciclismo é um esporte completo. Faz bem a saúde e estimula a auto-estima, pois depende apenas de esforço pessoal. Ao mesmo tempo é um esporte de individual e de caráter social.”- ressalta o pesquisador que pedala desde os 8 anos de idade e já fez inúmeros amigos após tornar-se adepto do ciclismo.
Mesmo que a contragosto, pelo menos no que se refere aos 62% dos entrevistados que gostariam de ter na bicicleta seu principal veículo, os transportes tradicionais ainda prevalecem na locomoção do dia-a-dia do carioca: 43% utilizam o ônibus, 24% o carro e 6% o metrô. Mas este quadro poderia mudar. Segundo Yang, a pesquisa sugere que a implantação de algumas ações poderiam incentivar a opção pela bicicleta, como infra-estrutura adequada ao uso, como bicicletários, melhor sinalização nas vias, vestiários próximos ao local de trabalho, educação no trânsito, entre outros pré-requisitos explicitados pelos entrevistados.
Yang I Ti afirmou que o objeto de sua tese foi fruto do acaso. Mas todos indícios contradizem esta tese. Confesso amante do ciclismo, Yang é morador de Vila Isabel . Ex – mestrando da COPPE, hoje engenheiro da CET – Rio, não abre mão de quatro dias na semana pegar sua bicicleta e sair por aí. Para isso não poupa esforços e prefere passear em grupo. Nestes dias acorda às 5: 30 da manhã, toma um suco, veste uma roupa apropriada e dirige – se ao ponto de encontro, geralmente um posto de gasolina. De lá parte para o destino combinado, que pode ser um passeio ao Alto da Boa -Vista, às Paineiras, ao final do Leblon. São inúmeras as trilhas, todas já mapeadas por Yang que, ao falar do seu esporte favorito, abre mão do tecnicismo e do tom acadêmico que prevaleceu durante a entrevista para descrever, quase em estilo literato, os prazeres do ciclismo. “É o veículo que possibilita maior interação com o meio ambiente. Além de silencioso, não é monótono, possibilita constante mudança na paisagem. Traz uma enorme sensação de liberdade, uma espécie de sintonia com o vento. É como estar voando”- conclui Yang, deixando uma ponta de inveja nos sedentários jornalistas da Assessoria da COPPE, alguns infomaníacos de plantão que, embora não tenham confessado, certamente saíram naquele dia cheios de planos e dispostos a resgatar da aposentadoria compulsória a velha bicicleta.