Pesquisa detecta hormônios nas águas dos rios Paraíba do Sul e Guandu
Planeta COPPE / Engenharia Química / Notícias
Data: 21/07/2009
Amostras de água não tratada do rio Paraíba do Sul, no estado do Rio de Janeiro, apresentam índice de atividade biológica hormonal que coloca em risco à saúde da população. A constatação é fruto da pesquisa realizada pela aluna de doutorado do Programa de Engenharia Química da Coppe, Amanda Cristina Vieira Dias, sob a coordenação da professora Marcia Dezotti.
A região do Vale do Médio Paraíba, que abrange as cidades de Resende, Volta Redonda e Barra Mansa, no estado fluminense, é a que apresenta a situação mais crítica. Neste trecho, um número significativo de amostras apresentou índice de atividade hormonal equivalente a presença de mais de um nanograma de estradiol por litro na água não tratada. Segundo a professora Márcia Dezotti, o estradiol é um hormônio capaz de alterar o funcionamento do sistema reprodutor de homens e animais “O índice detectado nas amostras é suficiente para gerar distúrbios no sistema endócrino de seres humanos e provocar, por exemplo, a feminização de peixes. Mesmo em baixa concentração, o estradiol aumenta o risco de doenças como câncer de próstata, mama e útero, e pode ocasionar infertilidade”, adverte a professora.
A pesquisa também avaliou a água tratada do rio Guandu, que abastece 80% da população da região metropolitana do Rio de Janeiro. Segundo Dezotti, das 15 amostras de água tratada que foram coletadas no Guandu, apenas uma apresentou o equivalente a um estradiol por litro, indicando baixa atividade hormonal. No entanto, o risco é iminente: oito das 15 amostras de água coletadas no mesmo rio, antes de passar pela central de tratamento, apresentaram atividades hormonais.
A professora adverte que a tendência é que esse tipo de poluição aumente cada vez mais, pelo uso constante de remédios e produtos químicos, que incluem até mesmo produtos de limpeza, desinfetantes e cosméticos. São produtos que apresentam atividade biológica, mesmo em baixa concentração.
Segundo Dezotti, no exterior o descarte dessas substâncias nos rios é motivo de preocupação de governos. “No Brasil, as estações de tratamento precisam ser modernizadas. Ainda hoje elas utilizam os mesmos métodos e tecnologias adotados na década de 50. Nesta época, a população era bem menor e nos últimos 50 anos surgiram uma enorme quantidade de novos produtos, principalmente os produzidos pela indústria química. Eliminar essas substâncias na água requer tratamentos especiais”, alerta.
Os pesquisadores da Coppe apontam como solução o uso combinado de cloro com ozônio. Nos testes realizados no Laboratório de Controle da Poluição das Águas da Coppe, as técnicas oxidativas que empregam o cloro ativo e o ozônio conseguiram reduzir, a níveis satisfatórios, a atividade hormonal presente na água coletada. Segundo Amanda, o uso do ozônio se mostrou eficaz, devido à baixa dosagem necessária para a remoção completa das atividades hormonais e pelo fato de não deixar resíduo na água.
“A implantação da ozonização em centrais de tratamento aumenta a qualidade da água, por se tratar de uma técnica capaz de promover o controle dos níveis de diversas classes de micropoluentes, além de contribuir para a desinfecção da água. A técnica, que vem sendo usada com sucesso na Europa, foi adaptada pelos pesquisadores da Coppe para ser aplicada na região do Paraíba”, explica Amanda, que até o final do ano defende sua tese de doutorado sobre o tema.
O percurso dos poluentes emergentes
Os hormônios podem se produzidos pelo próprio organismo ou ingeridos por meio de medicamentos, a exemplo dos anticoncepcionais. Parte é eliminada na urina e nas fezes e, no caso de fármacos como os antibióticos, por exemplo, cerca de 80% são descartados pelo organismo ainda na sua forma ativa. Segundo a professora Dezotti, o problema é que as técnicas tradicionais utilizadas nas centrais de tratamento de esgoto não conseguem remover completamente essas substâncias. Por isso, ao serem descartados, os hormônios se mantêm com atividade biológica nos corpos hídricos. Em várias amostras coletadas durante a pesquisa no rio Paraíba, os hormônios estavam associados à proteínas, que é a forma como são eliminados pelo organismo. “Essa associação indica duas possibilidades: ou o esgoto foi despejado no rio, in natura, sem ser tratado, ou a estação de tratamento não está sendo eficaz”, afirma.
Ao serem liberados nos rios, os hormônios se fixam em substâncias que podem ser ingeridas pelos peixes e, posteriormente, pelo homem. Também podem contaminar as águas de municípios vizinhos que são captadas para o consumo. Nesse caso, se a estação de tratamento de água desse município não usar métodos eficazes para eliminar os hormônios, seus habitantes vão consumi-los.
“No estado do Rio de Janeiro somente de 30 a 35% do esgoto é tratado. A situação vem se agravando nas últimas décadas com o surgimento de novos medicamentos e de produtos químicos que são resistentes ao tratamento convencional adotado nas estações de tratamento. Os remédios descartados como lixo comun são diluídos no chorume e acabam chegando aos rios, principalmente por meio da água da chuva”, explica a professora.
Para atacar esse problema, Dezotti defende a implantação no Brasil de um sistema de descarte e coleta especial para medicamentos não utilizados, como já ocorre em outros países, principalmente da Europa.