Science – Credibilidade nas metas de neutralidade climática é tema de artigo de professora da Coppe

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Data: 07/06/2023

A professora Joana Portugal Pereira, da Coppe/UFRJ, é coautora do estudo Credibility gap in net‐zero targets leaves world on high‐risk climate track, publicado nesta quinta-feira, 8 de junho, na revista Science. O estudo coordenado por Joeri Rogelj, professor do Centre for Environmental Policy do Imperial College London, busca olhar mais para as políticas concretas do que para as promessas. Ao avaliar a transparência e a credibilidade das mesmas, o artigo conclui que mais de 90% das estratégias de neutralidade climática anunciadas no âmbito do Acordo de Paris estão longe de serem alcançadas.

De acordo com Joana, o artigo aborda a credibilidade e a transparência das promessas de neutralidade climática (LTS) para 2050 anunciadas pelos países signatários da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC) e as implicações para a temperatura global até ao final do século.

“Em uma primeira etapa, desenvolvemos um ranking de transparência com base em três critérios para avaliar a credibilidade das medidas anunciadas para cada: (1) se a meta é juridicamente vinculativa, (2) se existe um plano nacional de política pública que apoia a implementação das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) e LTS, e (3) se as políticas de curto prazo de um país já colocam as emissões em uma tendência de queda. Em uma segunda etapa, esta avaliação foi usada para desenvolver projeções de emissões globais de gases de efeito estufa (GEE) e níveis de temperatura média até o fim do século”, explica a professora.

A classificação foi, então, usada para o desenvolvimento de projeções de emissões de GEE e aumento de temperatura que são diferenciadas de acordo com o grau de confiança. Os autores apresentam então cinco cenários, do mais conservador ao mais otimista: a) políticas atuais, desconsiderando metas de longo prazo e NDCs; b) políticas atuais e metas de neutralidade de carbono mais confiáveis; c) políticas atuais e metas de neutralidade de carbono mais confiáveis e menos confiáveis; d) políticas atuais e todas as metas de neutralidade de carbono; e) políticas atuais e todas as NDCs e metas de neutralidade de carbono.

Conforme o artigo, o cenário mais pessimista produz as maiores emissões e aquecimento e maior incerteza, gerando emissão anual de 52 a 60 GtCO2e até 2030, levando a uma estimativa mediana de aquecimento de 2,6°C até 2100. Por seu turno, o cenário mais otimista produz emissões, aquecimento e incertezas muito menores, levando o aquecimento global a um pico de 1,7°C.

Os autores afirmam que “mesmo a recente onda de atualizações nas NDCs e metas net-zero (compromisso de longo prazo de zerar as emissões líquidas de carbono) deixa grande incerteza sobre o quanto o mundo irá de fato aquecer. Essa incerteza recai, em grande parte, nos questionamentos à credibilidade dessas metas. Análises mais cautelosas que se atém ao status atual das políticas nacionais sobre as emissões sugerem que a temperatura vá se elevar entre 2,5°C e 3°C em 2100 e continuará a se elevar depois. Por outro lado, análises sobre as NDCs e metas de longo prazo, independentemente da credibilidade das mesmas, sugerem que o aquecimento irá se estabilizar entre 1,5°C e 2°C e gradualmente reverte perto do fim do século. Os dois prognósticos não poderiam ser mais contrastantes”.

“Os nossos resultados mostram que a grande maioria das estrategias prometidas não são credíveis e, se considerarmos apenas as medidas com elevado grau de confiança, as nossas projeções mostram um aquecimento global na ordem dos 2,4°C que poderá chegar a 3,0°C, o que está bastante acima dos níveis considerados seguros pelo conhecimento científico atual”, reforça Joana Portugal Pereira.

Quando apenas metas de alta confiabilidade são incluídas (cenário B), o aquecimento global é estimado em 2,4º C em 2100. Mesmo os cenários C e D excederiam o estipulado no Acordo de Paris. A conclusão dos autores é que, considerando a atual credibilidade dos compromissos climáticos, a comunidade internacional está longe de entregar um futuro climático seguro.

Credibilidade gera clareza

Na avaliação dos pesquisadores, credibilidade cria clareza. “A questão principal é ‘podemos acreditar que os países atingirão suas metas? Projetar trajetórias de emissão décadas no futuro é um exercício naturalmente incerto. Entretanto, a incerteza pode ser evitada acessando a confiabilidade e qualidade de cada meta e ajustando as projeções de emissões de GEE e temperatura global’”.

O artigo traz a ressalva de que, embora isso sugira que o cumprimento do Acordo de Paris esteja ao alcance, o fato de que 90% das metas de neutralidade de carbono atingem um grau baixo ou muito baixo de confiabilidade confirma que, em realidade, políticas concretas e confiáveis ainda estão distantes.

“A mensagem principal do nosso estudo é chamar a atenção para a necessidade de aumentar a transparência, eficácia e robustez das promessas climáticas anunciadas em fóruns internacionais. Para melhorar a credibilidade das medidas, sugerimos que os países garantam que suas estratégias de neutralidade climática em 2050 sejam acompanhadas com planos setoriais de implementação domésticos detalhados e de curto prazo para garantir ações imediatas”.

De acordo com os autores do artigo, garantir que as metas de neutralidade climática sejam vinculativas da jurisprudência nacional, planejar a implementação destas leis e traduzir esse planejamento em políticas públicas que reduzam as emissões, já no curto prazo, são passos cruciais para garantir o cumprimento destas metas. “Metas legalmente estabelecidas promovem continuidade e compliance. Países como Reino Unido, Canadá, Austrália, Chile, Japão e Nigéria já o fizeram”, afirma os pesquisadores.

“A grande maioria dos países se concentra no Artigo 2 do Acordo de Paris sobre medidas de redução de emissões até ao fim do século, esquecendo-se que o Artigo 4 refere a necessidade de começar a reduzir emissões “o mais rapidamente possível”, critica a professora Joana Portugal Pereira.

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