Vice-diretora da Coppe abre ciclo sobre Mudanças Climáticas

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Data: 15/08/2019

“Nós temos recursos naturais, nos faltam investimentos em ciência e tecnologia para alcançarmos as nações que são mais competitivas nesta guinada rumo a uma economia de baixo carbono”, afirmou a vice-diretora da Coppe, professora Suzana Kahn Ribeiro.

A vice-diretora da Coppe/UFRJ, professora Suzana Kahn Ribeiro, participou nesta segunda-feira, 12 de agosto, da sessão inaugural do ciclo de palestras “Desastres e mudanças climáticas: construindo uma agenda”, promovido pelo Colégio Brasileiro de Altos Estudos (CBRAE) da UFRJ. Suzana destacou que o Brasil possui um conjunto de vantagens comparativas que lhe pode colocar o país entre as lideranças mundiais de uma economia de “carbono zero”. Portanto, as mudanças climáticas são ao mesmo um tempo um desafio e uma oportunidade para o Brasil.

De acordo com a professora da Coppe, quando os pesquisadores reunidos pelo IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, em português) defendem a transição para uma economia “carbono zero”, isso não significa que não haverá mais emissões de gás carbônico e sim que o balanço (emissões – captura) será zero. “Para tanto, vai ser necessário que a gente tenha uma série de sumidouros de carbono: reflorestamento, uso de biomateriais, como temos pesquisado na Coppe; além da ampliação do uso de fontes de energia renováveis”, explicou.

Segundo Suzana, o Brasil tem enorme potencial sobretudo em energia eólica, solar e biomassa. Como exemplo, comparou o potencial de geração de energia solar do Brasil com o da Alemanha, um dos países mais avançados no setor. “A região brasileira que recebe menos radiação solar supera em 40% a área alemã mais iluminada pelo sol. Nós temos recursos naturais, nos faltam investimentos em ciência e tecnologia para alcançarmos as nações que são mais competitivas nesta guinada rumo a uma economia de baixo carbono”, complementou a vice-diretora da Coppe.

A professora explicou ao público que lotou o Salão Pedro Calmon, no Palácio Universitário da UFRJ no que consistem as mudanças climáticas, porque elas são agravadas pela ação humana e explicou o trabalho do IPCC, afastando dúvidas e inverdades tão disseminadas em tempos de negacionismo e fake news. “O clima envolve vários subsistemas: atmosfera, hidrosfera, criosfera, dentre outros. Havia um balanço, um equilíbrio que garantia a temperatura média global em torno de 15º. Com o aumento da temperatura, outro balanço vai ser encontrado em uma nova situação de equilíbrio. Essas temperaturas mais altas impactarão as relações entre oceanos e atmosfera, oceanos e solos. O problema não é o planeta, é a vida humana neste planeta”.

Ex-vice-presidente do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), de 2008 a 2015; Suzana aproveitou a ocasião para rechaçar alguns dos argumentos mais utilizados por aqueles que negam o consenso acadêmico em torno do aquecimento global. “O clima tem uma variabilidade natural. Daí alguns se pegam ao fato de que o planeta já teve eras mais quentes, eras glaciais, mas as mudanças se davam com escala longuíssima, dando tempo para adaptações. Os modelos climáticos mostram que nas últimas décadas as mudanças tomaram um ritmo mais rápido e isso se deu pela atividade humana”.

A professora Suzana Kahn Ribeiro explicou ainda que os relatórios elaborados pelo IPCC são baseados na literatura científica produzida por cientistas do mundo todo. “Lemos tudo que foi escrito sobre determinado assunto e pinçamos o que se tornou consenso. Então, não faz sentido associar o IPCC a teorias conspiratórias”, rechaçou.

Desastres ambientais e catástrofes políticas

“Há uma contradição fundamental entre o capital e Gaia, não há desenvolvimento sustentável possível sob o capitalismo”, criticou o professor Viveiros de Castro

O professor Eduardo Viveiros de Castro, do Museu Nacional (MN/UFRJ) correlacionou as mazelas ambientais trazidas pelas mudanças climáticas ao consumo de recursos naturais exigido pelo desenvolvimento das forças produtivas no sistema capitalista. “As catástrofes que se multiplicam são políticas e naturais ao mesmo tempo. É o que podemos chamar de eventos ontologicamente interseccionais ou fatos sociais totais. Não há decisão no plano político que não produza efeitos no mundo material”. 

“O nome dessa inseparabilidade é antropoceno (era geológica atual, marcada pela atividade humana) e sua tradução política é emergência climática. Uma situação que podemos classificar como epimeteica. Na mitologia grega, Epimeteu era irmão de Prometeu, aquele que trouxe o fogo à Humanidade. Prometeu era o herói do progresso, que pensa adiante. Epimeteu, por sua vez, é aquele que age primeiro e pensa depois, e assim sendo faz besteira. É o que fazemos. Agimos errado e olhamos pra trás e percebemos o mal feito. Após o orgulho prometeico (pelo conhecimento), vivemos uma situação epimeteica (arrependimento)”, dissertou o antropólogo.

Na avaliação de Viveiros, o planeta se defronta com a conjunção de política da catástrofe com a economia do desastre. “O capitalismo é ecocida (destrói intencionalmente ecossistemas). Há uma contradição fundamental entre o capital e Gaia, não há desenvolvimento sustentável possível sob o capitalismo”, criticou o professor.

“Precisamos também refutar, rechaçar qualquer tentativa de qualquer nível de governo de fazer prevalecer a ciência do achismo”, defendeu o jornalista André Trigueiro

O jornalista André Trigueiro, da GloboNews, também participou da sessão inaugural e cobrou que as situações sejam corretamente nomeadas pelo que elas são. “Não existe tragédia de Mariana, existe crime da Vale em Mariana. Não existe tragédia de Brumadinho, existe crime da Vale em Brumadinho. Existe uma profusão de evidências de que a Vale cometeu negligência, imperícia, irresponsabilidade”, apontou.

Otimista, Trigueiro ponderou que a despeito dos desafios que se avizinham, os países contam com trilhas para seguirem, como os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), propostos pela ONU. Mas, em relação aos problemas nacionais, o jornalista cobrou que as críticas sejam acompanhadas por propostas concretas para a correção de rumos.

“É muito fácil ser oposição a este governo. Não faltam motivos. Mas é preciso ter projetos viáveis, exequíveis, aglutinadores. Precisamos também refutar, rechaçar qualquer tentativa de qualquer nível de governo de fazer prevalecer a ciência do achismo em detrimento do pedigree acadêmico de pesquisadores de nível de excelência que o Brasil tem, como é o caso do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Aeroespaciais).

O ciclo reunirá professores de diversas áreas da UFRJ, dentre os quais Roberto Schaeffer e Joana Portugal Pereira, ambos do Programa de Planejamento Energético (PPE) da Coppe, para debater os diferentes aspectos das mudanças climáticas. A proposta é construir uma agenda social de enfrentamento do problema no Brasil. Todos os encontros são abertos ao público e também valerão como disciplina eletiva para alunos de pós-graduação. Saiba mais na página do CBAE.