Estudiosos traçam o Futuro do Trabalho em 2050 em estudo com participação da Coppe
Planeta COPPE / Engenharia de Sistemas e Computação / Notícias
Data: 27/04/2023
Pesquisadores do Laboratório do Futuro da Coppe/UFRJ participaram de um amplo estudo internacional que projeta o mundo em 2050, a partir da evolução tecnológica em curso e da que virá como provável consequência. O estudo sobre o futuro do trabalho foi realizado pelos membros do Projeto Millennium que, distribuídos em 71 nodos, somam mais de 300 futuristas, economistas, profissionais de Inteligência Artificial (IA) e de outras especialidades, de 60 países. Eles concluíram, no primeiro cenário, que são infundados os anseios atuais de que haja desemprego em massa devido aos avanços em Inteligência Artificial, robótica e outras tecnologias que substituam o trabalho humano.
Intitulado Future Work/Technology 2050, o estudo leva em conta as mudanças sistêmicas socioculturais-econômicas decorrentes da junção de tecnologias e suas sinergias, as Next Technologies (NTs). As projeções estão divididas em três cenários e são apresentadas como se já estivéssemos em 2050, avaliando tudo o que ocorreu nos 30 anos anteriores. A partir daí, os autores sugerem 93 ações com o objetivo de inspirar atitudes que podem ser adotadas por governantes, empresas, trabalhadores e outros atores sociais para que se chegue ao cenário desejável, e estimular ainda mais uma discussão global, sistemática e baseada em pesquisa sobre como fazer a transição para uma economia mundial modificada por tecnologias futuras previsíveis.
Entre os autores, estão o professor Jano de Souza e os pesquisadores Yuri Lima e Carlos Eduardo Barbosa, diretor e coordenadores das linhas de pesquisa “Futuro do Trabalho” e “Entendendo o Futuro”, respectivamente, do Laboratório do Futuro, ligado ao Programa de Engenharia de Sistemas e Computação (Pesc) da Coppe, que também foram os tradutores do estudo para o português. O Laboratório do Futuro integra o nodo brasileiro do Projeto Millennium junto com a Perspektiva, cuja presidente é a professora e futurista Rosa Alegria, e o com o Núcleo de Estudos do Futuro (NEF) da PUC-SP, dirigido pelo professor Arnoldo José de Hoyos Guevara.
Apesar de os autores concluírem no cenário 1 que o atual medo do desemprego em massa é sem fundamento, eles consideram tal anseio importante para estimular novos pensamentos. Intitulado “Está complicado – um pouco de tudo”, tal cenário mostra uma projeção da realidade na qual a humanidade segue fazendo tudo da forma como se faz hoje. Um fato que traz consequências negativas e positivas, uma vez que, de acordo com os autores, a sociedade atual tem uma série de desafios mal resolvidos ao longo da história e que se agravarão em 2050. A estimativa é que naquele ano a força global de trabalho seja de 6 bilhões, sendo que 2 bilhões estarão empregados, 2 bilhões atuando como autônomos (autoemprego), 1 bilhão na economia informal e 1 bilhão desempregados ou em transição. Os números são consequência do fato de que as novas tecnologias criarão tanto ou mais novos tipos de emprego do que substituirão, mas 1/6 de pessoas não terá sucesso na transição.
Os cenários e o Brasil
De uma forma geral, os autores dizem na introdução do estudo que se a IA pode evoluir para os pesadelos da ficção científica ou não, é certo que ela e outras tecnologias futuras mudarão o que pensamos ser possível nas próximas décadas, e também podem levar ao desemprego em massa. Eles explicam que, para endereçar isso, o Projeto Millennium iniciou uma avaliação internacional de vários anos para verificar o que pode ser feito. A intenção é verificar a melhor forma de a população mundial conviver com a implantação de novas tecnologias, a exemplo de robótica, biologia sintética, ciência computacional, nanotecnologia, computação quântica, impressão 3D e 4D, Internet das Coisas, ciência cognitiva, web semântica, aumento da inteligência humana, blockchain, veículos autônomos, tecnologia consciente e sinergias, entre outras.
O professor Jano destaca que é importante se analisar, como está no prefácio da edição brasileira, algumas questões levantadas pelos cenários em relação à realidade do país, devido às limitações e às potencialidades existentes no Brasil. O cenário 1, considerado intermediário, e o 3, visto como positivo, colocam o autoemprego como papel central. Sendo que esta promessa de autorrealização, por meio de uma autonomia, substituta do trabalho tradicional, não se cumpre para boa parte da massa de trabalhadores digitais do mundo que atua de maneira precária para garantir sua subsistência, como o que ocorre em países em desenvolvimento. A criação de empresas globais demanda apenas um pequeno grupo de trabalhadores altamente qualificados e bem remunerados. Esses geralmente são de países economicamente avançados e, com isso, haverá uma grande massa de trabalhadores precarizados distribuídos pelo mundo.
Pesquisas recentes sobre o impacto da automação no Brasil estimam que cerca de 60% da força de trabalho do país tem alta probabilidade de ser automatizada nas próximas décadas. O pesquisador Yuri ressalta que um desses estudos, o que foi realizado pelo Laboratório do Futuro, mostra, além desta questão, que, entre 2003 e 2016, a maior parte do emprego criado foi justamente nas ocupações que se encontram nas faixas de maior probabilidade de automação. Por isso, Yuri alerta que esses cenários para o país podem não ser tão otimistas quanto o relatório aponta de maneira mais global. Nem mesmo o terceiro, o mais otimista.
Intitulado “Se os humanos fossem livres – a economia da autorrealização”, o cenário 3 mostra uma possibilidade mais positiva para a sociedade em 2050, na qual, de acordo com a projeção, houve uma tomada de ações adequadas, nos anos anteriores, que se anteciparam aos impactos esperados. Com isso, a sociedade se ajudou na migração para uma nova realidade na qual a renda básica universal e o autoemprego se tornaram pilares da autorrealização humana. Desta forma, dos 6 bilhões da força de trabalho, 3 bilhões estão atuando como autônomos, com apenas 1 bilhão empregado. Os demais 2 bilhões se dividem igualmente entre os que estão na economia informal e os que estão em transição. Outros recortes revelam que as tecnologias surgidas nas décadas anteriores ao ano de 2050 criaram tanto ou mais novos tipos de emprego do que substituíram.
Pensamento econômico egoísta motiva o pior cenário
O cenário 2, “Agitação político-econômica”, é o mais desfavorável de todos e mostra que o número de empregados, em 2050, será apenas de 1 bilhão, a mesma quantidade de autônomos. Enquanto isso, 2 bilhões estarão na economia informal e outros 2 bilhões desempregados ou em transição. De acordo com os autores, o quadro é uma consequência do pensamento econômico egoísta e conflitos políticos de curto prazo, no início do século XXI, por parte dos governantes. Com essa atitude, eles não agiram para que a população se adequasse à rapidez da implantação de novas tecnologias, como Inteligência Artificial, robótica, impressão 3D e 4D, biologia sintética, dentre outras, que tornariam negócios atrás de negócios obsoletos, começando dramaticamente no final dos anos 2020 e início dos anos 2030. Por isso, tais tecnologias não criaram mais tipos de empregos do que substituíram.
O pesquisador da Coppe ressalta que a leitura deste segundo cenário pode dar a impressão de se tratar de um quadro que, infelizmente, já é realidade no Brasil atual. No prefácio da edição brasileira, Yuri Lima e os professores Rosa Alegria e Arnoldo Guevara explicam que o cenário 2 aborda a falta de estratégia governamental para lidar com novas tecnologias, alto desemprego, polarização social, impasse político, milícias e crime organizado. Eles destacam que todos esses elementos são realidades presentes nos noticiários do país de maneira cotidiana e, com isso, alertam que cabe refletir o quanto já estamos nos encaminhando, no presente, para o cenário de “desespero no futuro”. Por isso, consideram que as ações sugeridas ao final do relatório deveriam ser implementadas rápida e intensamente pela sociedade brasileira.
Devido a complexidade global que envolve o futuro do trabalho, demonstrada nos três cenários, cada uma das 93 ações sugeridas pelos autores foi avaliada por painéis internacionais que ainda sugeriram outras 118 ações adicionais. De acordo com o diretor-executivo do Projeto Millenium, Jerome Glenn, a magnitude das mudanças potenciais previsíveis é enorme, exigindo muito mais do que STEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática). Jerome explica, no prefácio do estudo, que para tornar todas essas informações mais digeríveis, as 93 ações estão divididas em seções de relevância para negócios e trabalho; governo e governança; cultura, artes e mídia; educação e aprendizagem; e comunidades de ciência e tecnologia.
“Qualquer um dos cenários apresentados pelo relatório pode se tornar realidade, e o destino ao qual vamos chegar depende das decisões que fazemos pelo caminho. Tanto o presente relatório quanto outras publicações sobre o tema colocam de maneira clara que futuros desejáveis dependem da ação conjunta de diferentes atores sociais, incluindo o Governo, as empresas, as instituições de ensino e os próprios trabalhadores. Esperamos que a leitura do relatório possa suscitar reflexões, discussões e ações importantes para lidarmos com o futuro da tecnologia e do trabalho no Brasil, mais do que conclusões sobre o assunto”, dizem os autores do prefácio da edição brasileira ao final do texto.
Confira o estudo: Relatório Trabalho-Tecnologia 2050
- Inteligência Artificial
- Laboratório do Futuro