A pandemia e os 60+
Planeta COPPE / Engenharia de Produção / Notícias
Data: 06/07/2020
Eles foram os primeiros a serem afastados do trabalho presencial e, possivelmente, serão os últimos a regressar. Como a pandemia de Covid-19 impacta e impactará a vida dos brasileiros e brasileiras com mais de 60 anos? A pesquisadora da Coppe/UFRJ, Márcia Tavares, especialista em gestão da longevidade e diversidade etária, destaca que o cenário atual reforça a vulnerabilidade desses profissionais, mas aponta caminhos para a inovação.
Os trabalhadores idosos constituem o grupo de risco com maior mortalidade pela Covid-19, resultado da associação do coronavírus a doenças preexistentes típicas da idade avançada. “Mas o bem-estar desses trabalhadores não está sendo ameaçado apenas pelo vírus, o que, por si só, já seria bastante assustador. A saúde física e mental também está sendo prejudicada pela falta de exercícios físicos e atividades cognitivas, e até mesmo, pela impossibilidade de manter as consultas médica, exames e tratamentos. Somam-se a isso, questões emocionais, como medo, solidão, depressão”, lembra Márcia.
A vulnerabilidade desse contingente de trabalhadores também está relacionada a um segundo aspecto que é a insegurança financeira. Um estudo recente conduzido pelo Laboratório do Futuro da Coppe, em parceria com a startup Labore, sob coordenação do pesquisador Yuri Lima, estimou que até 6,7 milhões de trabalhadores formais perderiam seus empregos, em função da pandemia da Covid-19. Preocupada com os idosos, Márcia Tavares pediu ao grupo um levantamento sobre a vulnerabilidade deles, e foi constatado que 1,2 milhão de trabalhadores com 50 anos ou mais, o que representa 18% do total, tinham grande probabilidade de serem dispensados.
“Apesar do pacote de ajuda do governo, é esperado um número expressivo de demissões no país. No entanto, para os trabalhadores 60+, o preconceito pode fazer com que a idade ganhe ainda mais força como critério para demissão, sobrepondo-se ao histórico de desempenho e potencialidades do trabalhador”, lamenta Márcia Tavares, fundadora e CEO da startup WeAge, residente na Incubadora de Empresas da Coppe.
Além dos mitos acerca da produtividade, “o trabalho flexível e remoto é um modelo novo para grande parte desse contingente de trabalhadores, que construiu sua carreira nos moldes do trabalho presencial. A transição é perfeitamente possível, mas demanda algum tempo de adaptação, estratégia e suporte das organizações”, explica a aluna do Programa de Engenharia da Produção da Coppe.
Em outros países, o risco de desemprego também tem sido maior para os 60+. Um estudo do Center for Aging Better alertou que a crise da Covid-19 pode levar uma geração de pessoas entre 50 e 60 anos a se aposentar com sérios problemas de saúde e sem dinheiro suficiente para se sustentar.
No entanto, segundo a doutoranda, “a boa notícia é que em contrapartida, há movimentos gratuitos de capacitação para esses profissionais e, até mesmo, iniciativas de contratação de profissionais com mais de 50+ anos, por exemplo, em empresas do setor financeiro que desejam oferecer consultoria com alto nível de experiência aos seus clientes”.
“Parte do que está por vir vai depender do mindset da empresa. Se está presa a ideias anacrônicas sobre os trabalhadores 60+ ou se já notou que um bom caminho para a retomada é contar com profissionais experientes, resilientes e leais à marca. Outra parte está com os profissionais 60+, que precisam aproveitar esse período para se dedicar ao aperfeiçoamento e desenvolvimento de competências”, ponderou a autora do livro Trabalho e Longevidade.
Márcia aponta a necessidade crescente dos profissionais de Recursos Humanos desenvolverem as competências necessárias para gerenciar a diversidade etária dos colaboradores. “Ter uma visão contemporânea sobre a carreira mais longa e conhecer o perfil dos seus colaboradores 50+, incluindo motivações, expectativas, projeto de vida e trabalho, irá conduzir a empresa a decisões mais igualitárias, assertivas e quiçá inovadoras neste momento”, explica.
Subterfúgio contra a finitude
Para Márcia, uma das formas pelas quais os trabalhadores mais experientes podem ressignificar este momento de isolamento social é com o trabalho voluntário. Notando a dificuldade de acesso das pessoas mais pobres aos meios adequados para se protegerem, a aluna da Coppe fez uma parceria em família para ajudar a quem mais precisa.
Márcia e sua mãe, dona Adélia Tavares, costuraram cerca de 600 máscaras que foram distribuídas nas cidades de Mesquita e Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, e também para os idosos hospedados na instituição de longa permanência Casa de Repouso Guaratiba. “Foi uma troca intergeracional. Eu aprendi a costurar e ela aprendeu a ideia de uma linha de produção, em especial, a higienizar corretamente tecido, local de trabalho, cortar e costurar grandes quantidades, armazenar, embalar. Entregamos mais de 600 máscaras até agora”.
“Estar ativo é se sentir vivo. É um fenômeno psicológico. Ao se aposentar, a pessoa idosa perde as conexões, o contato com clientes, colegas e fornecedores. O trabalho voluntário não aufere renda, mas resgata no idoso o sentimento de pertencer a uma comunidade e a sensação de utilidade. É um subterfúgio contra a finitude da vida”.
Na página da WeAge, além dos serviços de sua empresa, Márcia Tavares publica notícias e artigos de interesse do seu público-alvo. Entre eles, uma série de recomendações para gestores de Recursos Humanos estarem atentos a essas gerações.
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