Diretor da Embraer sobre o sucesso da aeronave E190-E2 e debate a proposta da joint-venture com a Boeing

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Data: 06/08/2018

Em palestra realizada na Coppe/UFRJ, nesta segunda-feira, 30 de julho, o diretor de Desenvolvimento Tecnológico da Embraer, Daniel Moczydlower, apresentou a bem-sucedida história do planejamento, da tecnologia e do plano de negócios da aeronave E190-E2, primeiro avião de sua categoria a conseguir, simultaneamente, certificação concedida pelas três maiores autoridades da aeronáutica internacional. A aeronave ingressou no mercado para substituir a primeira geração da família de aviões batizada como E-Jet, uma linha de produtos, lançada em 1999, que foi tão bem sucedida que provocou a saída do mercado de produtos de empresas tradicionais como Saab (sueca), Dornier (alemã) e Fokker (holandesa).

Questionado pela plateia, diretor da empresa e ex-aluno do Programa de Engenharia Química (PEQ) da Coppe também tirou dúvidas a respeito da joint-venture anunciada pela Embraer com a Boeing, maior empresa aeronáutica do mundo.

O diretor de Relações Institucionais da Coppe, professor Luiz Pinguelli Rosa, abriu o debate perguntando se não haveria uma alternativa para evitar a venda da Embraer, e que projetos estariam incluídos neste acordo. Segundo Pinguelli, tendo em vista que 80% das ações da nova empresa seriam controladas pela Boeing, o percentual de 80 para 20, na prática, proporcionará praticamente o controle e grande influência da empresa americana na gestão da Embraer.

Daniel Moczydlower destacou que a Embraer nunca esteve tão forte em portfólio de produtos e em atuação comercial. No entanto, “as perspectivas de mercado com o acordo entre sua concorrente canadense Bombardier e a gigante francesa Airbus fez com tivesse que ser, no mínimo, levado em consideração o estabelecimento com a Boeing de uma joint-venture” (nova companhia, na qual as empresas sócias compartilham a operação e os resultados financeiros da mesma). Para Daniel Moczydlower, é saudável que a sociedade discuta os prós e contras do acordo. Mas em sua avaliação, em dois pontos de maior interesse da academia – a demanda por engenheiros e o desenvolvimento de pesquisa tecnológica em solo brasileiro – há boas perspectivas.

O professor Aquilino Senra, do Programa de Engenharia Nuclear e ex-diretor da Coppe, manifestou sua preocupação em relação ao destino dos profissionais formados por centros de excelência do ensino superior público foi objeto de preocupação “Esse capital humano é compartilhado pelos três segmentos da empresa. Como vai ficar isso no futuro? Vocês vão perder um pouco da capacidade adquirida ao longo desses 50 anos de história?”.

O diretor da Embraer disse não crer em perda de capacidade, mas admitiu uma possível perda de sinergia. “Hoje, a Embraer se beneficia de uma sinergia pela circulação de engenheiros entre os diferentes segmentos de negócios. Isso acelera nossa curva de aprendizado. Estamos negociando acordos complementares com a Boeing que possam compensar isso, inclusive com alguma sobra. É uma opinião pessoal minha, eu acho que há uma boa chance de expandir essa competência em Engenharia instalada no Brasil. Minha expectativa é que essas duas empresas somadas venham a empregar um número muito maior de engenheiros do que faz hoje a Embraer sozinha”, avaliou.

Daniel antecipou que cerca de cinco mil engenheiros da Boeing se aposentarão nos próximos anos (número próximo ao contingente inteiro de engenheiros da Embraer). “Empresas tradicionais como a Boeing e Lockheed Martin estão tendo dificuldade de contratar mão-de-obra internamente (nos EUA). A nossa Engenharia, por várias métricas e critérios, é tão competente ou mais quanto à americana e tem mais ou menos 1/3 do custo. Acredito que ocorrendo a joint-venture, a demanda por engenheiros possa aquecer”, avaliou Daniel.

O que está em jogo na proposta da joint-venture

Em 5 de julho, a Embraer e a Boeing anunciaram a criação de uma joint-venture (no segmento da aviação comercial regional, o mais importante da empresa brasileira, responsável por 61% de sua receita). Pelo acordo, a empresa americana ficará com 80% da joint-venture, pagando US$3,8 bilhões por essa fatia (equivalente a 75% do valor de mercado da empresa brasileira, na ocasião do acordo), e a Embraer permanecerá com 20% da empresa. Os demais setores de atuação da Embraer – aviação executiva e defesa – ficam de fora deste acordo, permanecendo integralmente com a Embraer S.A.

De acordo com o diretor de Desenvolvimento Tecnológico da empresa, nos segmentos de Defesa e Aviação Executiva, está sendo desenhada uma série de acordos que poderão representar vantagens competitivas para a Embraer. “Um exemplo disso é o acesso à cadeia de fornecimento da Boeing pagando ‘preço Boeing’ (a escala de demanda da empresa leva a preços mais baixos). A empresa compra 20 vezes mais alumínio que a gente, logo tem um poder de negociação muito maior com os fornecedores”, citou Daniel.

Além disso, a parceria com a empresa americana pode alavancar as vendas militares da Embraer. “O produto de Defesa tem uma característica curiosa, o apoio geopolítico conta mais do que a qualidade e as especificações técnicas do produto. Há países para os quais o KC-390 (novo cargueiro desenvolvido pela Embraer) que é uma aeronave maravilhosa seria uma ótima opção, mas nos quais nem é possível sentar à mesa de negociação, pois eles só compram dos Estados Unidos ou Reino Unido”, explicou o diretor.

O acordo para criação da joint-venture precisa ser aprovado pelas assembleias de acionistas das duas empresas, em seguida ser aprovado pela Presidência da República – o governo federal detém a chamada golden share (ações com direito a veto) – e então pelas agências que controlam a concorrência em ambos os países. “Caso em qualquer uma dessas etapas, algo não for aprovado, a Embraer continuará no mercado, lutando com os recursos que tem”, complementou Daniel.

Na avaliação do diretor de Desenvolvimento Tecnológico da Embraer, a formalização do acordo traz uma expectativa de que a Boeing desenvolva conhecimento tecnológico no Brasil, tirando proveito das décadas de investimento em capital humano feitas no país. Segundo ele, a empresa americana investe em pesquisa e desenvolvimento por ano o equivalente a toda receita da Embraer. “Acredito que tenhamos diferencial competitivo em algumas áreas do conhecimento. Devemos reconhecer quais são e fortalecê-las, investir nelas. Deve ser construído com pragmatismo, e não dispersar recursos. Nós pecamos por querermos ser bons em tudo, aí diluímos recursos e não extraímos o máximo do potencial que temos”, alertou Daniel.

E2 190: a nova história de sucesso da Embraer

Embora a controversa joint-venture tenha sido objeto de maior interesse e apreensão do público, que se manifestou fazendo perguntas após a palestra, a instigante história do E2 190, que foi o tema principal abordado por Daniel em sua apresentação, encantou o público presente no auditório da Coppe.

O E2 190 é o primeiro avião de sua categoria a obter, simultaneamente, o Certificado de Tipo emitido pelas três principais agências de aviação do mundo: a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), a Federal Aviation Administration (FAA) e a European Aviation Safety Agency (EASA). Também é a primeira aeronave a ingressar comercialmente no mercado para substituir a família de aviões batizada como E-Jet. “Essa linha de produtos, lançada em 1999 foi tão bem sucedida que provocou a saída do mercado, de produtos de empresas tradicionais como Saab (sueca), Dornier (alemã) e Fokker (holandesa)”, explicou Daniel.

Apesar do sucesso desta primeira geração de E-Jets, a concorrência não ficou inerte. Além da principal competidora da Embraer, a canadense Bombardier, ter lançado o ambicioso projeto C Series buscando disputar o nicho de mercado dominado pela Boeing e pela Airbus, outras competidoras surgiram no mercado, como Mitsubishi (japonesa), Comac (chinesa) e Sukhoi (russa).

Atenta ao movimento das concorrentes, a Embraer, a terceira maior fabricante de aeronaves do mundo, com quase 50% do mercado de aeronaves com capacidade entre 70 e 130 assentos, deu início aos seus próprios planos. “A nossa área de inteligência e estudos de mercado é muito forte e sabe exatamente quantos aviões e de quais tipos serão aposentados nos próximos anos, em cada operadora aérea, no mundo. Assim, estudamos quais aeronaves seriam mais eficientes para as necessidades dos nossos clientes para suprir essa demanda futura. Qual avião eu preciso colocar no mercado daqui a dez anos para atender essa demanda?”, explicou Daniel.

Em apenas 62 meses, a Embraer tirou das pranchetas para a operação comercial a sua nova aeronave. “Embraer é benchmarking em desenvolvimento. Nenhuma outra empresa aeronáutica tem um ciclo tão curto, entre a tomada de decisão e a chegada do produto ao mercado. Para efeitos de comparação, o avião A380 da Airbus, cujo ciclo já fora mais curto do que a da maioria de seus concorrentes, foi desenvolvido, certificado e posto em operação em 83 meses”, enfatizou o diretor.

Certificada em 28 de fevereiro, a sua primeira unidade foi entregue em abril deste ano para a empresa norueguesa Widerøe, a maior companhia aérea regional da Escandinávia. A confiança da companhia norueguesa na tecnologia brasileira foi tamanha que a venda foi acertada antes mesmo da certificação ser obtida.

A nova aeronave emite 17,3% menos gases poluentes do que a geração anterior de E-jets da empresa. O E190-E2 é o avião mais ambientalmente amigável na categoria, com o menor nível de ruído externo e emissões de gases causadores de efeito estufa. Além disso, o tempo de treinamento de pilotos e mecânicos para o novo modelo de E-Jet é de apenas 2,5 dias.

Sobre a Embraer

Fundada em 1969, em São José dos Campos (SP), a Embraer é líder na fabricação de jatos comerciais de até 150 assentos e a principal exportadora de bens de alto valor agregado do Brasil.

Segundo Daniel Moczydlower, a sua origem da empresa tem raízes mais antigas e remonta à política industrial de longo prazo que foi pensada após a segunda guerra mundial. Para iniciá-la, o país começou por investir na base: na Educação. Foram, então, criados o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e o Centro Técnico de Aeronáutica (CTA). “Foi das pranchetas dos engenheiros formados por esses centros de excelência acadêmica que saiu o primeiro avião da Embraer: o Bandeirante.

Lá na empresa, nós dizemos o seguinte: A nossa gente nos faz voar. A gente tem competência de sobra na Engenharia brasileira para produzir histórias de sucesso. É a qualificação de nossos quadros que faz da Embraer o que ela é”, enalteceu.

A Embraer atua nos segmentos de aviação comercial, aviação executiva, defesa; e aviação agrícola. Desde que foi fundada, a companhia, que conta com mais de 100 clientes em todo mundo, já entregou mais de oito mil aeronaves. Em média, a cada 10 segundos uma aeronave fabricada pela Embraer decola de algum lugar do mundo, transportando anualmente mais de 145 milhões de passageiros.

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