O filósofo Jerome Glenn apresenta na Coppe visão otimista sobre o futuro e propõe cooperação global para desafios

Planeta COPPE / Notícias

Data: 24/10/2016

Prognósticos desafiadores, mas com razões para esperança. Essa foi a tônica do seminário internacional “Sobre o Futuro”, promovido pela Coppe/UFRJ e pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), que teve como palestrante o filósofo e futurologista americano Jerome Glenn. O filósofo americano iniciou a apresentação discordando da visão pessimista, amplamente difundida, de que o mundo está piorando. “Isto não é verdade. Estamos vencendo mais do que perdendo. Mas, no que estamos perdendo, a situação é preocupante. Uma dessas derrotas é a questão da criminalidade. O crime organizado movimenta três bilhões de dólares anualmente no mundo todo. O que equivale ao dobro do que todos os países somados gastam com seus orçamentos de defesa, a cada ano”, destacou.

Segundo Glenn, o crime organizado, em muitos lugares, está tornando a democracia uma ilusão. “Para lidar com algo dessa magnitude, não é mais possível enfrentar o crime organizado com base em políticas repressivas locais. Precisamos de uma estratégia global, um sistema global de políticas de segurança”, sugeriu o filósofo, advertindo que não basta um país adotar boas medidas de segurança se as nações vizinhas não fizerem o “dever de casa”.

CEO do Millenium Project, organização criada no âmbito da ONU que realiza estudos e projeções em diversas áreas do conhecimento, Glenn também mostrou cenários de longo prazo para temas como mudanças climáticas, migrações, epidemias globais, pesquisas tecnológicas avançadas, desigualdade socioeconômica e propostas de como responder a esses desafios.

Mudanças Climáticas: é preciso aprender com a natureza

“Precisamos descobrir formas de retirar carbono da atmosfera”, conclamou Jerome Glenn

Ao abordar mudanças climáticas – tema de grande interesse da universidade, na qual a Coppe se destaca com especialistas que integram o IPCC, da ONU – o futurologista disse que o aumento da temperatura global levará a uma mudança de padrões. Segundo Glenn, haverá mais tempestades, enchentes, secas e incêndios florestais. Haverá escassez e aumento no preço dos alimentos. O degelo no topo das cordilheiras afetará represas e o abastecimento de água e de energia”, afirmou. Segundo Glenn, os acordos internacionais para a redução de emissões de gás carbônico não são mais suficientes. “Precisamos descobrir formas de retirar parte desse carbono da atmosfera. As plantas fazem isso todos os dias. Precisamos aprender com a natureza. Esta é uma tarefa para os engenheiros”, propôs.

O filósofo chamou também atenção para os “conflitos inevitáveis”, como os que serão provocados pela migração de populações que habitam regiões litorâneas.  “Com o avanço do mar, causado pelas mudanças climáticas já em curso, essas populações abandonarão a costa e migrarão para áreas já ocupadas, gerando um grave impacto sociológico, sobretudo nos países mais pobres, com menos recursos para ações de prevenção e adaptação”, alertou.

Segundo Gleen, o grau do impacto socioeconômico dependerá das características topográficas das regiões atingidas. O Rio de Janeiro, por exemplo, encontraria na Serra do Mar uma barreira natural ao avanço das águas. Já a cidade de Bangladesh, cujo território é caracterizado por estar exposto a inundações, seria gravemente atingida pela elevação do nível do mar.

Epidemias de alcance global

Cenários projetados pelo Millenium Project indicam a emergência para o combate a graves epidemias de alcance global. Nos últimos seis anos, 1.100 epidemias foram registradas em todo o mundo, embora as taxas de mortalidade tenham diminuído devido aos avanços na Medicina e no acesso a remédios. No entanto, alertou Glenn, tem surgido organismos mais resistentes aos fármacos e aumentado, significativamente, sobretudo na China, as epidemias food-born (advindas da pecuária intensiva). Um exemplo é a recente gripe aviária surgida em suas granjas superlotadas. Cerca de 75% dos patógenos emergentes são zoonóticos (podem ser transmitidos de uma espécie animal para outra). Há ainda o risco do advento de um SIMAD (Single Individual Massively Destructive), único capaz de destruição em larga escala. “Trata-se de um “lobo solitário”, um terrorista que agindo sozinho, portando uma cepa de material biológico, possa causar uma epidemia de proporções desconhecidas.

Inteligência Artificial: robôs poderão superar seus criadores

A possibilidade da inteligência artificial superar a humana impressionou o auditório

A conversa assumiu ares de ficção científica quando o palestrante discorreu sobre Inteligência Artificial (IA). Segundo o futurologista, a IA está no primeiro estágio de seu desenvolvimento. O próximo passo é ela conseguir reprogramar a si mesma, de acordo com o feedback das ações para a qual foi previamente programada. No terceiro estágio, que impressionou o auditório, os robôs seriam capazes não apenas de reescrever seus próprios códigos, mas de redefinir os seus propósitos, superando, assim, os seus criadores. “E se não é possível vencê-los, una-se a eles”, recomendou Glenn.

Glenn defendeu que os cientistas concentrem esforços no desenvolvimento de tecnologias voltadas para agricultura com água salgada; captura de carbono; carros, ônibus e trens elétricos e automatizados de baixo custo; geração de energia geotérmica. Segundo o futurologista, o mundo se encontra na adolescência civilizacional. “Fazemos escolhas como os adolescentes: pensando no curto prazo e de maneira autocentrada. Temos que recompensar a maturidade e fazer um ‘voto’ econômico ao escolher produtos que desconcentram renda ou obedeçam a critérios de longo prazo”, exortou.

Agravamento de problemas sociais compromete o futuro do Brasil

Após a apresentação de Glenn, foi realizado um debate com os professores Luiz Pinguelli Rosa, diretor de Relações Institucionais da Coppe, Pedro Ribeiro Barbosa, vice-presidente de Gestão e Desenvolvimento Institucional da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Marcos Freitas, do Programa de Planejamento Energético da Coppe.

Segundo o professor Pinguelli, a grande revolução tecnológica não é a que está em curso, atualmente, mas a que aconteceu na virada do século XIX para o XX. “As pessoas se deslocavam a cavalo e se comunicavam por cartas, que levavam meses para chegar aos destinatários dependendo da distância. Agora nos deslocamos em alta velocidade e nos comunicamos em tempo real. Também houve uma mudança gigantesca na forma de produzir e consumir. Já vivemos em um mundo tecnológico há muito tempo”, afirmou o professor.

“O nosso maior desafio é a grande e crescente desigualdade social”, afirmou o professor Luiz Pinguelli Rosa

“Fazendo um filtro do que foi apresentado, hoje, temos motivos para preocupação, mas também para termos esperança. O nosso maior desafio é a grande e crescente desigualdade social, mesmo nos Estados Unidos, país líder da economia global. No Brasil, a situação atual é de agravamento dessa desigualdade. O interregno que tivemos com políticas compensatórias sofre retrocesso, e ainda há a possibilidade de congelamento dos gastos sociais. Não há dúvida de que haverá um agravamento do banditismo com o agravamento da desigualdade que já está em curso”, analisou Pinguelli.

O professor Pedro Ribeiro, da Fiocruz, também se mostrou preocupado com as perspectivas do país, em função do momento político, em que se avizinham medidas impopulares de austeridade fiscal. “Estamos em um seminário sobre o futuro, em um momento no qual o nosso está comprometido. Caso seja aprovada essa Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241, até o ano de 2036 estaremos com as verbas para ciência, tecnologia e educação congeladas em relação a 2016. Estamos reféns de governantes de ocasião com essa mentalidade”, lamentou o vice-presidente.

Jerome Glenn explicou que futurologistas não sabem necessariamente a verdade sobre o futuro. “Não disputamos com quiromantes. Desenhamos cenários e dizemos que ‘podemos ir por esse caminho’. Caso não gostemos das consequências do rumo que está em curso podemos fazer novas escolhas e mudar a rota. As pessoas racionais tomam decisões e ajustam seus planos medindo as consequências de suas escolhas. Sabemos que as mudanças estão se dando de modo tão rápido que as instituições, em seus formatos atuais, não dão conta de reagir. O que faz a Humanidade avançar é o sentido de urgência e direção. Eles tiram o que há de melhor em nós”, concluiu com otimismo o futurologista.

O seminário teve apoio da Fundação Coppetec, da Coppe, e da Fiotec, da Fiocruz. Também contou com o patrocínio do Instituto Virtual Internacional de Mudanças Globais (Ivig) da Coppe, da Rio Convention & Visitors Bureau (RCVB) e da Fundação Konrad-Adenauer (KAS).