Empreendedorismo Feminino: superando barreiras e inspirando transformações
Planeta COPPE / Incubadora de Empresas / Notícias
Data: 22/11/2024
No Brasil, o empreendedorismo feminino avança como um importante motor de transformação social e econômica. Uma pesquisa do Sebrae revela que, de 2021 para 2022, o número de mulheres à frente de negócios no país cresceu 30%, totalizando 10,3 milhões de empreendedoras. Apesar desse avanço, os desafios ainda são inúmeros: baixa representatividade, jornada tripla, acesso restrito a crédito, desigualdade salarial e preconceitos estruturais.
Para dar visibilidade a essas questões, a Lei 14.667/2023 instituiu a Semana Nacional do Empreendedorismo Feminino, consolidando novembro como um mês dedicado à conscientização sobre as barreiras enfrentadas pelas mulheres empreendedoras.
Histórias que inspiram
Em meio a desafios e superações, despontam exemplos como Márcia Tavares e Diana Mariani, empreendedoras do ecossistema de inovação da Coppe/UFRJ. Márcia é fundadora da ElaFutura, uma plataforma voltada para o empoderamento de mulheres maduras, e iniciou sua trajetória empreendedora com a WeAge, incubada na Incubadora de Empresas da Coppe/UFRJ. Já Diana é sócia-fundadora da GermSure, startup de biossegurança criada durante a pandemia de Covid-19, que desenvolve soluções inovadoras para diagnósticos.
Ambas são exemplos de como excelência acadêmica e espírito empreendedor podem se unir para enfrentar barreiras impostas por uma sociedade ainda marcada pelo patriarcado.
Márcia lembra que sua veia empreendedora começou na infância, inspirada por sua mãe, que assumiu o sustento da família após dificuldades financeiras. “Minha mãe, como tantas mulheres de sua geração, renunciou à carreira para cuidar da família. Quando meu pai perdeu o emprego, ela decidiu empreender para superar as adversidades. Essa força sempre me inspirou”, conta Márcia, mestre e doutora em Engenharia de Produção pela Coppe.
Diana, bióloga e PhD em Bioquímica pela UFRJ, destaca como o ambiente de inovação da Coppe foi crucial para transformar suas ideias em realidade. “Fundamos a GermSure em resposta à necessidade urgente de testes diagnósticos durante a pandemia”, explica.
Desafios estruturais persistentes
As trajetórias de Márcia e Diana refletem dados do Global Entrepreneurship Monitor (2018) e do Female Founders Report (2021), que apontam a baixa representatividade feminina no empreendedorismo. No Brasil, apenas 4,7% das startups são fundadas exclusivamente por mulheres, e menos de 10% contam com ao menos uma mulher no time fundador.
Esse cenário é agravado pela desigualdade na divisão de tarefas domésticas. Segundo o Sebrae (2023), mulheres empreendedoras dedicam, em média, três vezes mais tempo a afazeres domésticos e cuidados familiares do que os homens.
O acesso ao crédito também é um obstáculo significativo. Apenas 42% das empreendedoras conseguem aprovação de financiamentos, e startups fundadas por mulheres recebem menos de 12% dos investimentos de venture capital no país. Essas limitações financeiras agravam a desigualdade de rendimentos: mulheres que trabalham por conta própria ganham, em média, 21% menos que os homens.
Desigualdades regionais e raciais
Para mulheres negras, os desafios são ainda maiores. Elas enfrentam preconceitos relacionados a gênero, raça e desigualdades regionais. “Não esperam que uma mulher negra tenha conhecimento para empreender em tecnologia. Ser ouvida e ganhar credibilidade é uma luta
diária”, relata Diana.
A professora Amanda Xavier, especialista em empreendedorismo da Coppe, reforça a necessidade de políticas públicas e esforços coletivos para reduzir essas desigualdades. “Superar essas barreiras requer mais do que iniciativas individuais; é preciso ação integrada e sistemática.”
Impacto social e resiliência
Apesar das adversidades, o empreendedorismo feminino se destaca pelo impacto social. Empreendedoras têm maior taxa de formalização de negócios do que homens e empregam proporcionalmente o mesmo número de pessoas. Além disso, 90% adotam práticas sustentáveis, enquanto 80% desenvolvem estratégias com foco em impacto social, segundo o GEM Women Entrepreneurship Report 2022/2023.
“As mulheres não estão apenas criando negócios; elas estão moldando um futuro mais sustentável e inclusivo para suas comunidades”, conclui a professora Amanda Xavier.
O empreendedorismo feminino, portanto, não é apenas uma resposta aos desafios econômicos, mas um agente de transformação que inspira resiliência e promove a igualdade de gênero em todas as esferas.
Entrevista com Márcia Tavares e Diana Mariani: reflexões sobre
desafios, aprendizados e inspirações no empreendedorismo feminino
Duas trajetórias de superação e inovação que revelam os desafios e as conquistas do empreendedorismo feminino no Brasil. Márcia Tavares e Diana Mariani compartilharam suas experiências, oferecendo uma visão inspiradora e autêntica sobre o que significa liderar, inovar e romper barreiras.
O que te motivou a começar o seu próprio negócio?
Márcia Tavares:
Minha primeira experiência formal foi com a WeAge, uma startup incubada pela Coppe/UFRJ, voltada a promover um envelhecimento saudável e sustentável. No entanto, minha trajetória empreendedora começou muito antes. Desde a infância, observei minha mãe, que precisou empreender por necessidade para sustentar a família em meio a dificuldades financeiras e machismo. Ela foi minha maior inspiração. Se eu não acreditasse nos meus projetos, quem acreditaria?
Diana Mariani:
A ideia de empreender sempre esteve presente, mesmo na infância, quando imaginava criar bancas de revistinhas ou adesivos. Durante minha formação acadêmica, percebi lacunas no mercado, mas o meio acadêmico não incentivava o empreendedorismo. A GermSure surgiu da necessidade de transformar ideias em soluções práticas, especialmente em momentos críticos como a pandemia.
Houve dificuldades que você acredita que homens não enfrentam ao iniciar uma empresa?
Márcia Tavares:
Sim, o paradoxo de trabalhar dobrado para provar minha capacidade, enquanto era cobrada por dedicar “pouco tempo” à família, é algo que muitos homens não vivenciam. Essa cobrança dupla é uma barreira invisível, mas muito real.
Diana Mariani:
A jornada é mais árdua para mulheres, especialmente ao conciliar carreira e maternidade. Além disso, em negociações, percebi que as pessoas estão mais dispostas a ouvir um homem, o que, em algumas situações, exigiu o suporte de consultores masculinos.
Quais foram os maiores desafios ao iniciar sua jornada como empreendedora?
Márcia Tavares:
A falta de conhecimento em gestão, acesso limitado a recursos financeiros e a dificuldade em encontrar sócios foram obstáculos iniciais. Além disso, o mercado ainda era pouco maduro para as soluções que eu queria oferecer.
Diana Mariani:
No início, foi difícil romper preconceitos no ambiente acadêmico e empresarial, onde o empreendedorismo feminino ainda é visto com desconfiança. Também enfrentamos o desafio de estruturar a empresa durante a pandemia, conciliando demandas profissionais e familiares.
Como você enxerga a colaboração entre mulheres no ambiente empresarial?
Márcia Tavares:
Redes de apoio femininas são fundamentais. Conexões como Silver Founders e Nós por Elas têm ampliado meu acesso a conhecimento, financiamento e parcerias estratégicas. Precisamos priorizar fazer negócios com outras mulheres e enfrentar juntas os preconceitos de gênero e idade.
Diana Mariani:
Na GermSure, somos quatro sócias mulheres, todas mães. Essa dinâmica cria um ambiente de empatia, onde nos apoiamos mutuamente, inclusive em ausências inevitáveis. Porém, isso também pode gerar desafios, como a dificuldade de nos impor como líderes.
Como o preconceito ainda se manifesta no mercado para mulheres empreendedoras?
Márcia Tavares:
O preconceito de gênero é constante, especialmente para mulheres maduras, que enfrentam barreiras adicionais no mercado. A idade muitas vezes é vista como um limitador, quando, na verdade, deveria ser valorizada como experiência.
Diana Mariani:
Infelizmente, o mercado ainda reage de forma diferente à presença de mulheres. Em negociações, precisamos nos apresentar detalhadamente para sermos ouvidas. Quando acompanhadas por um homem, o tom da conversa muda drasticamente.
Como sua trajetória pode inspirar outras mulheres?
Márcia Tavares:
Espero que minha história mostre que empreender é uma forma de criar impacto, mesmo em meio a desafios. Precisamos acreditar em nossos projetos, buscar redes de apoio e persistir, porque nossos esforços têm o poder de transformar realidades.
Diana Mariani:
Acredito que minha jornada pode inspirar mulheres a enxergar o empreendedorismo como uma ferramenta de empoderamento e mudança. Vejo isso nas funcionárias da GermSure, que se aprimoram constantemente e perseguem novos sonhos.
Você acredita que o mercado já é igualitário para homens e mulheres?
Márcia Tavares:
Ainda estamos longe da igualdade. Mulheres continuam tendo que trabalhar mais para provar seu valor, além de enfrentarem barreiras culturais e estruturais. Contudo, avanços importantes têm ocorrido, e cada conquista é um passo adiante.
Diana Mariani:
Definitivamente, não. Ainda temos que “provar” constantemente nossas competências. Apesar disso, acredito no poder da representatividade. Quanto mais mulheres empreendem e lideram, mais inspiramos outras a trilhar esse caminho.