Experiências do Olhar conquista prêmio Ibermuseus de Educação: tecnologia do projeto foi desenvolvida na Coppe

Planeta COPPE / Engenharia Civil / Notícias

Data: 28/11/2019

Gerson Cunha, Célia Lopes e Luiz Landau, do Lamce, responsáveis pelo projeto

O projeto “Experiências do Olhar”, que permite ao público apreciar sensorialmente uma obra de arte, por meio de sons, aromas e tato, ampliando o acesso a deficientes visuais, conquistou o terceiro lugar no 10º Prêmio Ibermuseus de Educação, edição 2019. A tecnologia desenvolvida por pesquisadores do Laboratório de Métodos Computacionais em Engenharia (Lamce) da Coppe/UFRJ foi aplicada na exposição do quadro “Visão Carioca”, do artista pernambucano Cícero Dias, que está na sala batizada com o nome do projeto, no Museu do Ingá, em Niterói.

O Ibermuseus é o principal programa de cooperação de museus da Ibero-América e visa a fortalecer as mais de nove mil instituições existentes na região. Concorreram à premiação, cujo valor total é de 75 mil dólares, projetos de 14 países latino-americanos.

Rômulo Morgado explica aos visitantes detalhes do ambiente

A sala “Experiências do Olhar” foi projetada com soluções tecnológicas desenvolvidas no laboratório da Coppe. O projeto é fruto de uma parceria entre o Museu do Ingá, a Coppe, a Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa do Rio de Janeiro, e a Fundação Anita Mantuano de Artes do Estado do Rio de Janeiro (Funarj).

“O grupo incluiu especialistas em acessibilidade, profissionais que atuam em museus e pesquisadores da Coppe. Trabalhamos juntos dividindo experiências que deram certo para reproduzi-las”, afirmou Gérson Cunha, que coordena o Grupo de Realidade Virtual Aplicada (GRVa) do Lamce da Coppe e já liderou projetos no Museu Histórico Nacional e na Escola de Belas Artes da UFRJ.

“Foi um casamento perfeito”, destacou o produtor cultural do Museu do Ingá, Rômulo Morgado, explicando que a investigação do uso dos odores, sons e tato para visualização científica realizada pela pesquisadora de pós-doutorado da Coppe, Maria Célia Santos Lopes, veio ao encontro da proposta do museu para o uso de novas tecnologias.

Segundo Maria Célia, que está realizando sua pesquisa sob a orientação do professor Luiz Landau, do Programa de Engenharia Civil da Coppe, a consultoria do portador de deficiência visual Leonardo Dias, que trabalha no Museu Histórico Nacional (MHN), foi fundamental para o sucesso do projeto.

“As pessoas que não enxergam precisam fazer um mapa mental do que está sendo descrito e para isso se apoiam em narrativas de outros ou se valem do tato. No entanto, nem sempre a audiodescrição e o uso de réplicas e de impressões 3D são usadas em exposições. Além disso, a descrição é realizada por pessoas diferentes, forçando uma reformulação do mapa mental já construído”, explica Célia, que com as dicas de Leonardo foi aos poucos descobrindo as carências e aperfeiçoando o projeto.

“O Léo nos mostrou que os deficientes visuais querem compreender a obra de arte, sentir o que está acontecendo ali. A audiodescrição, por exemplo, é feita de forma totalmente neutra, sem passar emoção. Uma obra de arte é exatamente o oposto disso”, ressaltou Gérson Cunha.
A exposição é aberta ao público, de quarta a domingo, das 12h às 17h (exceto nos feriados). Para quem quiser aguçar ainda mais os sentidos, o museu oferece uma visita especial, na qual as pessoas vivenciam a experiência de olhos vendados. Mas essa visita é para um grupo de 10 pessoas, acima de 10 anos, e precisa ser agenda pelo e-mail museudoingaeducativo@gmail.com ou ligando para (21) 2717-2919. A entrada é franca e o endereço é Rua Presidente Pedreira, 78, Ingá, Niterói.

Sobre “Visão carioca”

Com oito metros de comprimento, a obra de Cícero Dias foi encomendada pelo então governador do Estado do Rio de Janeiro, Carlos Lacerda, para a comemoração do 4º centenário de fundação do Rio de Janeiro, em 1965. Ela retrata parte da cidade nos anos 1960, a partir de um observador que estaria nas proximidades da Estrada das Paineiras, na Floresta da Tijuca. Do lado esquerdo há um conjunto de casas em Santa Teresa, depois ao fundo, o Pão de Açúcar, a enseada de Botafogo, algumas construções do bairro homônimo, e cada vez mais à direita, há um adensamento gradativo da vegetação da floresta.

Para o coordenador do GRVa, o desafio era dar vida a um quadro praticamente estático sem indicações de movimento. “Nossas experiências pessoais determinam nossas interpretações do mundo. A gente colocou várias coisas baseado no que o grupo achava que a obra representasse pela nossa vivência. Assim, há sons de crianças brincando, de carrinho de rolimã ou de talheres, há também cheiro de café, de terra molhada e outros. Em cada parte há um som ou aroma diferente”, explicou Cunha, lembrando que a equipe da Coppe aproveitou diversas tecnologias já existentes e que estão aí no mercado.

Assim, à medida que o visitante, vidente ou não, se desloca diante do quadro, entra em contato com diferentes sons e aromas. “Havia diversos desafios. Os aromas, além de precisarem no ambiente, não poderiam se misturar uns com os outros. Sem contar que era preciso evitar que o extrato agredisse a obra de Cícero Dias. Os sons precisaram ser equalizados de uma forma que fossem ouvidos em uma pequena área, sem atrapalhar quem estava na outra extremidade”, relatou Gérson Cunha.

Visitas Especiais

Embora a sala “Experiências do Olhar” seja compartilhada por deficientes visuais e público vidente, o museu oferece uma visita guiada especial, na qual as pessoas fazem a visita com os olhos vendados. O objetivo é aguçar os outros sentidos, estimulando uma inevitável empatia entre público vidente e deficiente visual. Para efetuar essa visita é preciso formar grupos de até dez pessoas, com mais de 10 anos, e agendar previamente para participar do programa.

“Todos ficam vendados por alguns minutos e seguem um trajeto narrado pelos guias, sabendo que não há perigo, diferente do cotidiano de quem não enxerga, mas o exercício é intrínseco à atividade. O objetivo principal é mostrar aos videntes que é possível ter a experiência da visita indo além do sentido da visão. O museu tradicional pode e deve ser um local de experiência”, ressaltou Rômulo Morgado.

Segundo o produtor, “Experiência do Olhar” é um espaço inclusivo e um local acessível para pessoas com deficiência visual. “A obra de Cícero Dias é a primeira, inaugurou a sala. Mas a gente vai ter outras obras com sons, cheiros e toque para consolidar o local. É um espaço fixo, com programação estruturada para atender pessoas com deficiência”, relatou Morgado, antecipando que já tem data marcada para a inauguração da próxima exposição: em 18 de maio de 2020.

A diretora do Museu do Ingá, Julia Wagner Pereira ressalta que a grande conquista desse projeto foi integrar pessoas que pensam e trabalham com cultura no Rio de Janeiro em prol de soluções que possibilitem experiências novas e diferenciadas “A cada dia fica evidente que ninguém faz nada sozinho. Há uma rede de apoio, de troca. Essa rede é cada vez mais potente, necessária e viabilizadora”, disse.