Pesquisadores chineses e latino-americanos debatem inovação e mudança climática
Planeta COPPE / Engenharia de Transportes / Engenharia Química / Notícias
Data: 31/08/2016
Políticas de inovação bem-sucedidas, instrumentos de transferência de tecnologia e pesquisas voltadas ao enfrentamento das mudanças climáticas foram objeto de debate no 1º Fórum China América Latina de Inovação e Tecnologia, que foi realizado na Coppe/UFRJ, nos dias 29 e 30 de agosto.
O evento promovido pelo Centro China-Brasil de Mudança Climática e Tecnologias Inovadoras para Energia reuniu pesquisadores, secretários de governo e dirigentes de universidades e institutos de pesquisas do Brasil, China, Argentina, Colômbia, Chile, Cuba e Peru, no auditório da Coppe. O Fórum foi uma primeira iniciativa para ampliar a já bem-sucedida cooperação acadêmica entre a Coppe e a Universidade de Tsinghua, e possibilitou que acadêmicos latino-americanos e chineses apresentassem o estado da arte do ambiente de pesquisa científica e inovação tecnológica em suas nações.
O professor Dehua Liu, diretor da Universidade de Tsinghua e co-presidente do Centro China-Brasil, fez uma apresentação acerca da política de inovação tecnológica chinesa. Segundo Liu, o objetivo da política chinesa é otimizar os ambientes de inovação e empreendedorismo; reforçar o caráter inovador das instituições acadêmicas; reforçar leis de proteção intelectual e erigir um sistema estrito de propriedade intelectual.
Além disso, o governo chinês colocou como meta quebrar monopólios e segmentação de mercado que restringem a inovação, reforçando leis antitruste e proibindo condutas monopolistas e abuso da dominância de mercado.
“Em 2015, a China aprimorou sua legislação para acelerar a transferência de conquistas científicas e tecnológicas. A nova lei apoia a inovação com políticas fiscais e tributárias e políticas pós-subsídios, visando encorajar empresas a ampliar investimentos em pesquisa e desenvolvimento, com incentivos fiscais. A competição é a melhor maneira de incentivar a inovação tecnológica”, relatou o professor Liu.
Buscando o próprio caminho para a inovação
Na avaliação do vice-diretor da Coppe e também presidente do Centro China-Brasil, professor Romildo Toledo, o ambiente de inovação está bem estabelecido no país, com a existência de parques tecnológicos e startups, mas é preciso avançar na transferência de tecnologia à sociedade. Para Toledo, a China tem avançado rapidamente neste quesito, mas o modelo, ainda que inspirador, não pode ser copiado, pois cada país tem suas próprias especificidades legais, burocráticas e políticas. “Não há outra forma de desenvolver o país, senão com políticas de alto nível em educação, ciência e tecnologia”, afirmou o professor.
O diplomata Luiz Augusto de Castro Neves, presidente do Conselho Empresarial Brasil-China, destacou que a produtividade é essencial para a perspectiva econômica de um país, sobretudo quando a sua população está em processo de envelhecimento. “Como os inputs (capital e trabalho) não podem crescer indefinidamente, a produtividade – que permite produzir mais com o mesmo estoque de insumos – é que permite o crescimento sustentável no longo prazo”, explicou Castro Neves.
“Os chineses foram ágeis em perceber uma característica da globalização: a internacionalização dos processos produtivos, e se inseriram nas cadeias de valor de maneira mais vantajosa. Os produtos chineses invadiram o mercado internacional, mas a China exporta muito porque importa muito também. A América Latina, por sua vez, pautou seu desenvolvimento, historicamente, na substituição de importações, o que levou a uma tendência ao protecionismo e pouca ênfase na busca por produtividade”, comparou o diplomata, que foi embaixador em Pequim (2004-2008).
Para Daniel Lau, diretor da empresa de consultoria KPMG, vive-se um momento especial na relação bilateral, no qual os investimentos trazem tecnologia e demanda por serviços e fornecedores brasileiros, além da geração de empregos. “É uma bola de neve. Quanto mais empresas chinesas vêm ao Brasil, mais seus competidores na China ficarão curiosos em descobrir o mercado, saber porque essas empresas estão vindo, e pensarão em investir também”, avaliou Lau.
A coordenadora de tecnologia industrial básica do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), Cristina Akemi, ponderou que embora o Brasil seja o 13º país no mundo em produção de conhecimento, é apenas o 69º no Índice de Inovação Global. Para fazer frente a isso, o governo federal lançou a Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação 2016-2019, que, dentre outras diretrizes, estabelece a meta de que o investimento no setor chegue a 2% do PIB.
Transferindo tecnologia
Cristina apresentou alguns dos instrumentos e instituições, por meio dos quais o ministério pretende aprimorar o ambiente de inovação no país, dentre os quais, a Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii), o Programa Nacional de Apoio às Incubadoras de Empresas e aos Parques Tecnológicos (PNI), o Sistema Brasileiro de Tecnologia (Sibratec), e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), que apoia financeiramente projetos de pesquisa por meio de 16 fundos setoriais.
O professor José Carlos Pinto, do Programa de Engenharia Química da Coppe, atualmente diretor do Parque Tecnológico da UFRJ, apresentou um panorama das atividades do Parque e destacou a diversificação das mesmas, antecipou que em 2017, duas novas empresas inaugurarão seus centros de pesquisa no Parque, a L´Oreal e a Ambev.
Pinto ressaltou que não obstante o Parque Tecnológico seja visto como um projeto maduro, ele teve sua urbanização iniciada em 2003, e recebeu a primeira grande empresa, a Schlumberger, em 2007. “Em 10 anos, o cenário mudou rapidamente. Isso mostra como o ambiente é dinâmico, e como há margem para muitas realizações. Estamos finalizando nosso plano estratégico para os próximos trinta anos, almejando expandir atividades, diversificar o portfólio, estabelecer parcerias internacionais e estimular as pequenas e médias empresas”, explicou o diretor do Parque.
O professor da Coppe enfatizou ainda que o Parque tem diversificado suas atividades, oferecendo serviço de pós-incubação, para empresas de todo o país, recém-graduadas de incubadoras; co-working, com 40 espaços de trabalho (workstations) individuais, 313,5 m² de área compartilhada (shared area) e salas de convivência (meeting rooms).
Mudanças climáticas: a vulnerabilidade dos mais pobres
Na terça-feira, os debates se concentraram no combate às mudanças climáticas. Foi consenso a necessidade da articulação entre ciências humanas, hard sciences e políticas governamentais para que o desenvolvimento sustentável seja priorizado.
Na opinião do professor Germán Poveda, do departamento de Geociências e Meio-Ambiente da Universidade Nacional da Colômbia, a influência humana no clima é clara, o aquecimento global inequívoco, e a vulnerabilidade climática é maior nos países tropicais, sobretudo na América do Sul, África subsaariana e Sudeste asiático.
Segundo estimativas, a Colômbia pode ter uma perda de até 77% do seu PIB devido às mudanças climáticas. O país produz cerca de 80% de sua energia a partir de hidrelétricas e uma frequência maior de estações secas comprometerá o abastecimento do país. Além disso, explicou o professor, “o degelo nos Andes afeta o abastecimento de água na Bolívia e no Peru e compromete os ecossistemas da região. A América Central e o Caribe se tornam mais expostos a tornados e furacões, que incidirão com maior frequência e magnitude. A incidência de doenças como malária e dengue é maior durante o fenômeno El Niño, e com o aquecimento global este e outros eventos climáticos extremos se tornarão mais frequentes”.
“Mas há esperança, pois a opinião pública está mobilizada e isso influencia os políticos e demais tomadores de decisão. A preocupação com a preservação ambiental e as mudanças climáticas não é mais uma questão para acadêmicos e ambientalistas, e já é pauta até do Vaticano (Encíclica Laudate Si), de bilionários como Bill Gates e até mesmo o FMI já defende a taxação das emissões de carbono”, celebrou Poveda.
O professor Zhou Jian, do Instituto de Energia, Meio Ambiente e Economia, da Universidade de Tsinghua, explicou que a China persegue suas metas climáticas com cooperação Sul-Sul (parceria entre países em desenvolvimento), colaborando com as nações latino-americanas por intermédio da Comunidade de Estados Latino-americanos e Caribenhos (Celac) e com os países africanos por meio de incentivo financeiro. De acordo com Jian, para viabilizar este incentivo, o governo chinês constituiu o Fundo de Cooperação Climática Sul-Sul, que, entre 2005 e 2010, desenvolveu 115 projetos de cooperação, no montante de 180 milhões de dólares. Só em treinamento e capacitação foram 85 parcerias com as nações da África. Em 2013, o presidente Xi Jinping anunciou que elevaria para US$3,1 bilhões o aporte de recursos ao Fundo.
A engenheira Gleyse Peiter, coordenadora do Laboratório Herbert de Souza da Coppe, apresentou iniciativas inovadoras de cunho social, explicitando as atividades da Rede Nacional de Mobilização Social e do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas. De acordo com Gleyse, os grupos mais afetados pelas mudanças climáticas são as comunidades tradicionais, os povos indígenas, os camponeses que trabalham na agricultura familiar, e pessoas em situação de extrema pobreza.
Segundo Gleyse, os estudos desenvolvidos pela Coppe e seus laboratórios contribuíram para que o governo formulasse suas propostas nas Conferências das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP 15 e 16), e também forneceram subsídios para a elaboração do Plano Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC), regulamentado em 2009, e do Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima (PNA), lançado em 2016.
A professora Suzana Kahn, do Programa de Engenharia de Transportes da Coppe/UFRJ, e coordenadora-executiva do Fundo Verde da UFRJ, por sua vez, apresentou as ações de sustentabilidade desenvolvidas na Cidade Universitária, viabilizadas financeiramente pelo Fundo.
Dentre elas, o maior estacionamento solar do país em geração de energia, com espaço para 55 carros e capacidade para gerar 140 KW por ano; bicicletários; o Caronaê, aplicativo de mobilidade compartilhada; e a instalação de equipamentos de iluminação mais eficiente, o que gerou 400 mil reais por ano de economia na conta de luz da universidade. “Devemos usar o campus como laboratório para testarmos conceitos e produtos, que poderão ser replicados no Rio de Janeiro e outras cidades”, defendeu Suzana Kahn.